Veronesi: Um dicionário do coração
CRÓNICA
| Maria Joana Almeida
“(…) É a demonstração de que os olhares
são armas poderosíssimas e produzem
choques emocionais mesmo
quando não têm o objetivo de provocar.”
Sandro Veronesi vence (pela segunda vez) o prémio Strega com o seu mais recente romance, O Colibri. Numa espécie de cronologia backwards e revisitada, o autor relata a história de Marco Carrera, um oftalmologista de Florença, através de cartas enviadas a amigos e familiares. E é neste espetro de tempo que se constrói a história de Marco. Os seus vazios, arrependimentos, mágoas e conquistas em tom mezzo.
Neste livro Sandro Veronesi senta-se ao nosso lado enquanto nos desvenda, de forma direta e pouco floreada, os segredos das relações humanas. Entrega-nos um dicionário do coração e descreve, de forma irrepreensível, sem autocomiseração ou vitimização, os acontecimentos mais difíceis de viver, e por isso, mais difíceis de escrever.
Escreve, a certa altura, que “a civilização ficou de joelhos”. E foi esta a primeira imagem que me reteve. Na verdade, a civilização de quem quer conhecer os assuntos do coração e alinhar nós emocionais, fica de joelhos perante este livro.
E ao longo do crescendo emocional da narrativa e das surpresas inesperadas, atira-nos para o colo choques emocionais tratados aqui com dignidade e inteligência. Seguramos o choro, que poderia ser tão fácil, porque somos invadidos por um alinhamento de palavras que conseguem manter-nos erguidos, de costas direitas, enquanto encaramos a realidade inevitável. E este é o tom que se eleva ao longo da narrativa e com o qual termina. E é esta a arma poderosíssima deste livro.
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Sandro Veronesi
O Colibri
Quetzal 18,80€