Vergílio Alberto Vieira | Nunca Direi Quem Sou
1- O que representa, no contexto da sua obra, o livro “Nunca
direi quem sou”?
direi quem sou”?
R-Em tempos de “tanta guerra, tanto engano”, escrever já não
é o verbo intransitivo fundador de utopias (e de outras eventualidades),
próximas da vulgar retórica da sentimentalidade e da mediatização burlesca a
que assistimos, mas parte dessa legitimação de todos os crimes que, de Pessoa a
Genet, por exemplo, tenta contrariar a delapidação acelerada do que resta da
ética do valor (moral, ou apenas mural) e estético a que a pornografia da
insignificância steineriana roubou razão de ser. Ainda que alguma realidade crítica diga o contrário, eu não
tenho “obra”; o que me proponho realizar é “ser obra”; vai daí, vou escrevendo
(editando livros de poesia, ficção, teatro, diários, literatura de leitura
infantil e juvenil) para evitar, como parodiava Fernando Assis Pacheco, o
acidente vascular; se não cerebral, dizia ele; o literário, digo eu. Este livro (propõe-se/ propõe-me ser lido): é uma fuga
(musicalmente falando) ao que sou; o que pretendo é falar ficcionalmente pelos
outros – Chuang-tsu, Sapho, Epitecto, Borges, Pessoa, Vergílio Ferreira, Dinis
Machado, Lispector, Cesariny, Herberto Helder – não para me procurar, mas para
me encorajar a saber quem sou.
é o verbo intransitivo fundador de utopias (e de outras eventualidades),
próximas da vulgar retórica da sentimentalidade e da mediatização burlesca a
que assistimos, mas parte dessa legitimação de todos os crimes que, de Pessoa a
Genet, por exemplo, tenta contrariar a delapidação acelerada do que resta da
ética do valor (moral, ou apenas mural) e estético a que a pornografia da
insignificância steineriana roubou razão de ser. Ainda que alguma realidade crítica diga o contrário, eu não
tenho “obra”; o que me proponho realizar é “ser obra”; vai daí, vou escrevendo
(editando livros de poesia, ficção, teatro, diários, literatura de leitura
infantil e juvenil) para evitar, como parodiava Fernando Assis Pacheco, o
acidente vascular; se não cerebral, dizia ele; o literário, digo eu. Este livro (propõe-se/ propõe-me ser lido): é uma fuga
(musicalmente falando) ao que sou; o que pretendo é falar ficcionalmente pelos
outros – Chuang-tsu, Sapho, Epitecto, Borges, Pessoa, Vergílio Ferreira, Dinis
Machado, Lispector, Cesariny, Herberto Helder – não para me procurar, mas para
me encorajar a saber quem sou.
2- Qual a ideia que teve na origem deste livro?
R- Na sequência do que disse, fica a descoberto um belo lapalissade: como se tornou moeda corrente esquecer que: “Existe uma eterna
repetição”, princípio nietzschiano filosoficamente caído em desgraça, a
frivolidade actual não deixa margem para reflectir sobre cada acto (falhado)
consentido, à luz das políticas torcionárias que governam o mundo, contribuindo
para multiplicar a subida ao patíbulo da(s) sociedade(s) medíocre(s) ante o
tribunal da memória.
repetição”, princípio nietzschiano filosoficamente caído em desgraça, a
frivolidade actual não deixa margem para reflectir sobre cada acto (falhado)
consentido, à luz das políticas torcionárias que governam o mundo, contribuindo
para multiplicar a subida ao patíbulo da(s) sociedade(s) medíocre(s) ante o
tribunal da memória.
Esta série de retratações ficcionadas nasceu da inquietação
que a idade (já provecta) foi acumulando, e para a qual não vislumbro resposta:
“Que quer o homem, afinal, saber de si próprio?”
que a idade (já provecta) foi acumulando, e para a qual não vislumbro resposta:
“Que quer o homem, afinal, saber de si próprio?”
3-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R-Depois de preparar a edição da poesia anterior (1980-2015):
Todo o trabalho toda a pena (2016), que inclui os inéditos: Halo y tangência e
O inventor de rios, reescrevendo alguns livros (quase) na íntegra, dei-me a
constatar que pouco mais tinha a dizer, e que, como nada se sabe sobre a
imortalidade (de que serviria sabê-lo?), a ideia de futuro, à maneira da fúria
da paixão na velhice, torna-se uma dança sem par (parecida com a do belo e da
consolação, que fingem que dançam).
Todo o trabalho toda a pena (2016), que inclui os inéditos: Halo y tangência e
O inventor de rios, reescrevendo alguns livros (quase) na íntegra, dei-me a
constatar que pouco mais tinha a dizer, e que, como nada se sabe sobre a
imortalidade (de que serviria sabê-lo?), a ideia de futuro, à maneira da fúria
da paixão na velhice, torna-se uma dança sem par (parecida com a do belo e da
consolação, que fingem que dançam).
Se a ideia de escrever se presta a entrar na roda, e dá
largas à lógica de competição desenfreada que por aí grassa (festivais,
prémios, & outras badalações artísticas), o escriba abisma-se nesse vórtice
de que não há retorno, vindo a dar razão ao (insepulto) Heidegger, quando
profetizou que: “Quem não sabe pensar conta uma história.” Eu não tenho nada para contar. E não quero: pena minha,
provavelmente, até só penso que penso. Por isso, vou escrevendo a pensar que a
sabedoria popular é implacável: “Quem faz borrões que os leia.”
largas à lógica de competição desenfreada que por aí grassa (festivais,
prémios, & outras badalações artísticas), o escriba abisma-se nesse vórtice
de que não há retorno, vindo a dar razão ao (insepulto) Heidegger, quando
profetizou que: “Quem não sabe pensar conta uma história.” Eu não tenho nada para contar. E não quero: pena minha,
provavelmente, até só penso que penso. Por isso, vou escrevendo a pensar que a
sabedoria popular é implacável: “Quem faz borrões que os leia.”
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Vergílio Alberto Vieira
Nunca Direi Quem Sou
Companhia das Ilhas, 11€
Companhia das Ilhas, 11€