Ricardo Gil Soeiro | O Alfabeto dos Astros
1-O que representa, no contexto da sua obra, o livro «O Alfabeto dos Astros»?
R- Após a publicação de O Pensamento Tornado Dança, Gramática da Esperança, Iminência do Encontro e A Alegria do Sim na Tristeza do Finito, quatro obras de carácter eminentemente ensaístico e dotadas de um fôlego filosófico bastante vincado, o ano de 2010 trouxe-me finalmente a oportunidade de proceder à publicação de um livro que pertence ao género que mais cedo cultivei: o da poesia. Na verdade, a obra O Alfabeto dos Astros, que constitui pois a minha primeira obra poética (embora tivesse já publicado vários poemas em diversas revistas poéticas, nomeadamente na Revista Autor, na Revista Inefável ou na Revista Desassossego), assume uma enorme importância para mim. A maior parte dos poemas deste livro, bem como a estrutura geral que lhe está subjacente, já estava praticamente finalizada há dois anos. Estou em crer que se trata de um livro ainda inicial, um primeiro livro que revela uma voz tacteante à procura de um rumo, mas creio que essa cartografia incerta poderá ser uma vantagem: é com um certo despudor (espero que audacioso…) que as costuras se encontram à mostra e as palavras ainda estão pintadas de fresco por assim dizer; com isso revelam as hesitações, as contradições produtivas, enfim, a incompletude de um projecto sempre em devir. A poesia permite isso: sempre achei que o labor poético vale sobretudo pelo trajecto percorrido e não tanto pelo resultado final; pelo menos para o autor (confesso que quando termino um poema sinto um enorme vazio…). Isto não significa abdicar de um rigor que é absolutamente indispensável. Quer apenas dizer que a poesia tem sempre que naufragar pelas margens incertas e ambíguas da linguagem promovendo múltiplas leituras e interrogações; é desse modo enigmático que a palavra poética pode aspirar a espreitar para lá da cortina da vida, contemplar o espelho infiel do que somos: pelo menos é assim que eu a vivo e a sinto.
R- A ideia geral do livro brotou do fascínio que duas frases sempre exerceram sobre mim (e que, de resto, escolhi para epígrafe): em primeiro lugar, a frase de Mallarmé em Divagations: “Tu remarquas, on n’écrit pas, lumineusement, sur champ obscur, l’alphabet des astres, seul, ainsi s’indique, ébauché ou interrompu; l’homme poursuit noir sur blanc”; em segundo lugar, a frase de Borges em El outro, el mismo: “aquí también el místico alfabeto de los astros, que hoy dictan a mi cálamo nombres que el incesante laberinto de los días no arrastra.” Estas duas cintilações poéticas levaram-me a considerar que decerto poderia haver um enigmático alfabeto dos astros à espera de ser escrito, pedindo para ser escrito. Foi essa a aventura que aceitei com este livro.
3-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R- Neste momento estou a terminar o livro Labor Inquieto (poesia) e a iniciar um projecto de âmbito mais académico: o livro A Sabedoria da Incerteza que, em princípio, será publicado no final de 2012.
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Ricardo Gil Soeiro
O Alfabeto dos Astros
Edium Editores