Pinto Serra | Viagem Através do Nosso Distanciamento

1- O que representa, no contexto da sua obra o livro
“Viagem Através do Nosso Distanciamento”?
R- Toda a minha obra ficcionista ( três colectâneas de
contos, dois romances e um livro de literatura juvenil em co-autoria ) se
baseou num compromisso com a denúncia das várias personalidades que diariamente
assumimos – consciente ou inconscientemente – 
perante os outros e perante nós próprios. Pretensos retratos das
inúmeras máscaras utilizadas desde o nascimento até à morte, a poesia, a ironia
e a compreensão estão sempre subjacentes a essa realidade descrita com a irreverência
própria de um escritor insubmisso à condição alienante da sociedade
desumanizada em que vivemos. São jogos diários de vivências muitas vezes
absurdas, mas reais, que atingem proporções trágicas no último romance (
“Ao sabor das pequenas coisas” ), de tal modo que foi considerada uma
obra de leitura eventualmente chocante, pela linguagem utilizada e pelas
situações descritas. Isso não impediu que tivesse ganho o prémio Fialho de
Almeida ( talvez pela inovação da técnica literária  utilizada).
Na poesia ( oito livros publicados ), assumo com  nitidez a minha condição de poeta intimista,
embora sempre condicionado pela realidade social onde estou inserido, já que o
faço sempre na primeira pessoa do plural ( pudor?… solidariedade?…),
tentando esconder a influência das minhas próprias vivências.
Neste contexto, este livro ” Viagem através do nosso
distanciamento” ( Prémio Nacional de Poesia da Vila de Fânzeres – 21ª
edição – 2012 ), embora mantendo as mesmas características formais  de quase todas as obras poéticas anteriores,
representa uma tentativa de regresso às minhas origens literárias, expressas,
curiosamente, no meu livro de estreia, vencedor da 9ª edição do Prémio Nacional
de Poesia da Vila de Fânzeres, em 1998. Alimento nele uma necessidade poética
de sintetizar num só livro todas as recordações – por que não dizer saudades? –
do lugar onde nasci, onde vivi a minha infância e a minha adolescência, depois
de um trajecto de vida em que quase tudo já foi feito, a nível social, familiar
ou literário.
2- Qual a ideia que esteve na origem deste livro?
R – Como disse anteriormente, e de acordo com o título da
obra, esta “Viagem através do nosso distanciamento” pretende ser um
regresso, através da memória, às origens de alguém ( o autor e todos os que,
como o autor, sentem a necessidade desse regresso ) que se distanciou, ao longo
do tempo, das suas raízes. Aliás, no meu livro de poesia “Pelas margens da
serenidade” já se esboçava essa necessidade, só agora inteiramente
assumida. Dedicada ao reencontro com o passado, esta “Viagem” faz-se,
na sua primeira parte, de um modo subjectivo e, sobretudo, metafórico. Já  na segunda parte ( “o outro lado da
sedução” ) toma aspectos muito mais objectivos, literariamente mais
compreensíveis ao leitor, porque descreve lugares e situações concretas que
povoaram a sensibilidade poética do autor, enquanto jovem.
3- Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R – Não consigo, nem nunca consegui, concentrar-me  apenas numa obra, desde o seu início até à sua
conclusão. Conforme a disponibilidade e a inspiração em cada instante da minha
vida, escrevo, quase todos os dias, um pouco de cada livro em que estou
empenhado. Mas a poesia está sempre presente em tudo o que escrevo. Daí a sua
influência e a sua presença em todas as obras de ficção que já fiz e que
continuo a fazer.
Neste momento, estou ultimando o meu oitavo livro de poesia,
dedicado todo ele ao envelhecimento ( sou professor em três universidades da
terceira idade, leccionando a disciplina “A arte de envelhecer”) e
trabalho numa nova colectânea de contos, para além de um romance de cariz
policial e de uma peça de teatro a ser levada à cena pelos meus alunos de uma
das universidades da terceira idade onde lecciono. Em co-autoria com uma colega
escritora, estamos a preparar a publicação de um livro de crónicas, todo ele
dedicado à triste realidade do envelhecimento em Portugal, nomeadamente nas
suas vertentes mais confrangedoras ( abandono – social e familiar -, protecção
estatal, áreas residenciais para séniores, etc…etc….
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Joaquim Manuel Pinto Serra
Viagem Através do Nosso Distanciamento
Lugar da Palavra