O desatino dos anjos
É uma ficção, meio científica meio espírita, se é que há metades nesta área. E se é que há esta área. Daí a dificuldade de encarar cientificamente uma incursão em território tão especulativo, em que o mais concreto são as referências a um capacete e a um arsenal de meios pouco esclarecedores sobre a natureza da inventiva: meios computacionais e programas.
O objectivo dos dois cientistas (ele, psicofísico) que trabalham no projecto só lá para a frente a narrativa esclarece: transmitir a outrem as memórias de alguém, transformando o receptor numa espécie de médium, por meios tão materiais como o tal capacete e o código estabelecido informaticamente. Estes são os bons da fita, mais três protagonistas que acabam por se encontrar movidos por um sonho comum centrado numa capela escocesa.
Os maus aparecem da forma mais tradicional, com o assassínio dos dois investigadores, devidamente laureados com um Nobel, por via dos seus trabalhos “no domínio das neurociências”. Os maus pertencem, neste caso, naturalmente, ao mundo de uma agência americana que, vamos ver lá para o fim, já estava em roda livre e os defeitos dos seus procedimentos não podem ser atribuídos ao sistema.
O arrependido de entre os maus fica pelo caminho, ele que já estava a entrar no mundo dos que lograriam deixar a sua herança espiritual, uma espécie de sementeira da memória legada aos vindouros. E era isso, com toda a capacidade de influência e manobra que os da agência transviada tanto ambicionavam – que eles, “leigos”, lograssem materialmente, cientificamente, os êxitos de previsão e comunicação que até aí estavam reservados aos médiuns.
A história será fraca, com êxito reservado aos entusiastas desta temática. A aposta do autor parece residir na escrita, no ritmo, e tal terá sido conseguido, atendendo ao anúncio de que está a caminho uma adaptação cinematográfica. O ritmo, sim, pela rapidez, o capítulo curto, à Dan Brown – diga-se. Como se uma boa história vivesse exclusivamente disto. Não parece o caso, a história está mal apoiada “cientificamente”, admitindo que seria possível estar bem suportada, e por vezes estilística e estruturalmente parece uma aventura do “grupo dos cinco”.
E, no entanto, o autor, que começou no cinema como pirotécnico, é um homem empenhado na “comunicação das emoções”. E terá ficado contente com a obra, a avaliar pelo rol final de agradecimentos, a quantos estimularam o seu trabalho. Que seja por bem.
Mal, mesmo mal, as gralhas e erros ortográficos que caem no texto ao longo de todo o livro. Se as gralhas são lamentáveis, a ortografia é matéria que não devemos deixar introduzir-se nas cabecinhas, tanto mais se há o risco de os lapsos serem propagados a terceiros por uma qualquer via extra-sensorial (ou tão prosaica quanto este exílio angelical).
Médium, vá lá, analfabeto é que não – e aqui “serro” os punhos.
__________
Gilles Legardinier
O Exílio dos Anjos
Publicações Europa-América, 21,90€
O objectivo dos dois cientistas (ele, psicofísico) que trabalham no projecto só lá para a frente a narrativa esclarece: transmitir a outrem as memórias de alguém, transformando o receptor numa espécie de médium, por meios tão materiais como o tal capacete e o código estabelecido informaticamente. Estes são os bons da fita, mais três protagonistas que acabam por se encontrar movidos por um sonho comum centrado numa capela escocesa.
Os maus aparecem da forma mais tradicional, com o assassínio dos dois investigadores, devidamente laureados com um Nobel, por via dos seus trabalhos “no domínio das neurociências”. Os maus pertencem, neste caso, naturalmente, ao mundo de uma agência americana que, vamos ver lá para o fim, já estava em roda livre e os defeitos dos seus procedimentos não podem ser atribuídos ao sistema.
O arrependido de entre os maus fica pelo caminho, ele que já estava a entrar no mundo dos que lograriam deixar a sua herança espiritual, uma espécie de sementeira da memória legada aos vindouros. E era isso, com toda a capacidade de influência e manobra que os da agência transviada tanto ambicionavam – que eles, “leigos”, lograssem materialmente, cientificamente, os êxitos de previsão e comunicação que até aí estavam reservados aos médiuns.
A história será fraca, com êxito reservado aos entusiastas desta temática. A aposta do autor parece residir na escrita, no ritmo, e tal terá sido conseguido, atendendo ao anúncio de que está a caminho uma adaptação cinematográfica. O ritmo, sim, pela rapidez, o capítulo curto, à Dan Brown – diga-se. Como se uma boa história vivesse exclusivamente disto. Não parece o caso, a história está mal apoiada “cientificamente”, admitindo que seria possível estar bem suportada, e por vezes estilística e estruturalmente parece uma aventura do “grupo dos cinco”.
E, no entanto, o autor, que começou no cinema como pirotécnico, é um homem empenhado na “comunicação das emoções”. E terá ficado contente com a obra, a avaliar pelo rol final de agradecimentos, a quantos estimularam o seu trabalho. Que seja por bem.
Mal, mesmo mal, as gralhas e erros ortográficos que caem no texto ao longo de todo o livro. Se as gralhas são lamentáveis, a ortografia é matéria que não devemos deixar introduzir-se nas cabecinhas, tanto mais se há o risco de os lapsos serem propagados a terceiros por uma qualquer via extra-sensorial (ou tão prosaica quanto este exílio angelical).
Médium, vá lá, analfabeto é que não – e aqui “serro” os punhos.
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Gilles Legardinier
O Exílio dos Anjos
Publicações Europa-América, 21,90€