Maria Joana Almeida: “A escrita ajudou a apaziguar a raiva, a saudade e a explosão”
1-“Estamos Todos em Fila de Espera para a Morte» é o seu livro de estreia: como espera poder olhar para ele daqui a 20 anos?
R- Talvez como um ponto final de um ciclo de explosão. Este livro é um diário de, sensivelmente, um ano que retrata o que foi viver sem a minha mãe após a sua morte. É provavelmente um lugar-comum, mas efetivamente a escrita ajudou a apaziguar a raiva, a saudade e a explosão. Os textos descrevem um processo do que foram os dias após a morte da minha mãe. Que espaço habitava passados dois dias, três, um mês, um ano. O que fica e o que vai e como se transforma. Como me fui apaziguando com a vida. Como foi difícil gerir o peso esmagador da maternidade, das responsabilidades quando estava sempre pronta a explodir. O meu trabalho, a minha relação com as outras pessoas. Descobrir outras casas e olhar para as casas que me reconstruiram.
2-Qual a ideia que esteve na origem desta obra?
R- A origem esteve numa ilustração maravilhosa da ilustradora Marta Nunes que adquiri após a morte da minha mãe. Era uma ilustração sobre a saudade. E não havia outra palavra que me preenchesse melhor do que aquela. Quando a vi e quando a comprei pensei na imagem de “mandar vir a saudade” e de se ter “instalado sozinha sem permissão”. Aquela ilustração era eu. Depois fui seguindo o trabalho da Marta, cruzando com o que sentia. Com o que a saudade, às vezes esmagadora como uma pedra, outra como um rastilho pronto a explodir, me fazia agir e sentir. Foi claramente um processo catártico para acalmar a dor. E tenho a forte convicção que tudo o que está neste livro já (ou será) foi sentido por todos nós. Tenho uma amiga que ilustrou, na minha opinião, de uma forma engraçada a minha escrita. Como uma “auto-estrada direta ao coração”. Acrescentaria que de facto há poucas curvas. É crua, mas melódica.
3-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R – Depois de todo este processo de escrita e terminado este livro, sinto que há, como disse, um ponto final. Um maior apaziguamento com a vida. Uma reconstrução. Apanhei os cacos e estou a reconstruir. Tem-me apetecido escrever sobre o amor. Sobre histórias de amor. Pequenas imagens ou pensamentos de fracção de segundos. O que sentimos numa relação. Ou fora de uma relação. Os pensamentos que elaboramos sobre o amor. E onde é que ele está. Este segundo livro será claramente o capítulo seguinte do que ficou e como se reequilibrou a dor.
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Maria Joana Almeida
Estamos em Todos em Fila de Espera para a Morte
Elefante Editores 10€