Manuel Pedro Quintas: Afonso de Portugal. Testamento de um Rei(no) Improvável
1-Como surgiu o interesse (e o fascínio) pela figura de D. Afonso Henriques?
R- Creio que todos nós, portugueses, conhecendo melhor ou pior a figura do nosso primeiro Rei, por ele nutrimos algum fascínio. Afonso Henriques é entre nós, e quanto a mim justamente, considerado como o “Pai da Pátria”. Falamos de um homem que viveu numa época remota, e tão pouco documentada, que a procura de uma lógica que vincule os vários acontecimentos é, por si só, fascinante. Depois, todo o misticismo religioso e o emaranhado cultural que caracteriza a época em que o nosso primeiro Rei foi actor principal, e que por ele foram tão sabiamente utilizados na construção deste Reino improvável, a ideia de cruzada, usada como um meio e não como um fim, os jogos de poder entre Castela e Roma…
2-Qual a ideia que esteve na origem deste livro?
R- Quando iniciei a pesquisa para este livro estava emigrado em Minas Gerais, Brasil. O ambiente aí é propício a este tipo de reflexões, tanto mais que eu já tinha visitado uma boa parte do que foi o Império Colonial Português. Não se tratou de saudosismo, sentimento que de certa forma aprecio, por genuinamente português, mas com que pouco me identifico. Foi mais a procura de uma explicação para a improbabilidade de sucesso de um Reino se constituir entre a Espanha e o Mar. Um projeto que, à nascença, estaria condenado a abortar, não tivessem os nossos antepassados ousado, com grande maestria, andar no Mar. Já dizia Platão existirem três tipos de homens: os mortos, os vivos, e os que andam no mar. Como país, a raiz da nossa vocação atlântica, encontra em Afonso Henriques a sua génese, e na combinação dos povos arianos e semitas que nos deram origem, a sua razão de ser.
3-Ao estudar as várias facetas da vida de D. Afonso Henriques, o que mais o surpreendeu?
R- No estudo da vida do nosso primeiro Rei tentei desmistificar a figura do herói, mostrando mais o carácter de um homem de seu tempo. Um homem da baixa Idade Média, com uma religiosidade própria, envolta num misticismo que chega a ser violento, com os seus vínculos familiares e de vassalagem, autênticos códigos de ética da época. Mas, ao mesmo tempo, o homem prático, sem pudor, sem muito atentar nos meios para chegar aos fins. À medida que vamos descobrindo Afonso Henriques vamo-nos fascinando com a personagem de quase bandoleiro enquanto Rei, realidade de que ele próprio vai tomando consciência, operando uma metamorfose de uma para outra destas polaridades até ao final do seu reinado.
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Manuel Pedro Quintas
Afonso de Portugal. Testamento de um Rei(no) Improvável
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