Manguel e Borges
CRÓNICA
| Rui Miguel Rocha
Ler o que se espera encontrar em tanta inteligência, tudo tão natural que desponta como um sorriso.
Olha que dois, é caso para dizer.
Sei agora que em certas cegueiras de bibliotecários anciãos, o amarelo é a última cor a desaparecer. Sei também que não sou o único a guardar pequenos tesouros dentro dos livros que leio, quem sabe para prosas futuras. Borges até dinheiro, e quando necessitava lá percorria vários tomos para pagar qualquer conta imprevista, como todas as contas.
O ser implacável contra os prosadores enumerativos, mas também o ser que se cansa com os livros e conversas literárias, como todos nós com tudo, como todos nós com a vida.
“A sua admoestação ao sobrinho de cinco ou seis anos: ‘Se te portares bem, autorizo-te a pensares num urso.’”
E também com os mais velhos: “Não tinha paciência para a estupidez e declarou uma vez, depois de conhecer um professor universitário enfadonho: ‘Preferia conversar com um canalha inteligente.’”
Pensa Deus como um sonhador universal e em “modernizar a literatura por via da tradução.”E “Os Borges” com D. Sebastião em pano de fundo “São o rei que no mágico deserto se perdeu/e todos os que juram que ele não morreu.” Agostinho iria gostar disto, mas também da frase que nos resume se tivermos sorte: “O nosso dever moral é sermos felizes.”
Assim seja.
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Alberto Manguel
Com Borges
Tinta da China 11,90€