Luís Naves | Portugal Visto pela CIA

1-Qual a ideia que esteve na origem deste seu livro
“Portugal Visto pela CIA”?
R- Este livro, Portugal Visto pela CIA, baseia-se na análise
de documentos secretos da espionagem americana sobre o nosso País, escritos ao
longo de mais de 40 anos. Estes relatórios foram desclassificados e o
jornalista espanhol Eric Frattini, conhecido especialista em questões de
espionagem internacional, conseguiu ter acesso em Washington a uma colecção que
incluía uma centena de relatórios, que entregou à Bertrand. Eu fui convidado
pela editora para tentar escrever um livro sobre estes documentos, muitos dos
quais a CIA entretanto colocou na internet. Em resumo, Portugal Visto pela CIA
analisa os documentos obtidos por Eric Frattini, foi enriquecido com material
que não constava desta primeira colecção de textos e, evidentemente, procurou
contextualizar as opiniões dos agentes americanos, usando a literatura
existente sobre as relações entre Portugal e os Estados Unidos.

2-Quais as principais revelações que conseguiu descobrir e
contar neste livro?
R- Não se pode dizer que este livro tenha revelações
bombásticas, embora o essencial seja novo. Sendo a obra baseada em relatórios
escritos por espiões, não é possível saber se determinado documento foi crucial
para justificar uma determinada decisão dos responsáveis americanos. O que se
adivinha é que um relatório secreto enviado para Washington possa ter sido
influente. O livro revela as intenções e a mentalidade dos agentes da CIA em
relação a Portugal, em relação ao império ou ao Estado Novo. O livro permite
compreender melhor o que pensaram os americanos sobre Salazar e a Revolução,
sobre a guerra colonial ou o início do período democrático. Antes de Portugal
Visto pela CIA, sabia-se o que tinham discutido e escrito os diplomatas
americanos em vários momentos essenciais da nossa história recente. A partir de
agora, sabemos também alguma coisa sobre o que pensaram os espiões americanos.
Dito isto, as omissões também podem ser reveladoras, pois há assuntos que ainda
não foram desclassificados, por exemplo, tudo o que se refere à “Abrilada” de
1961, à morte de Sá Carneiro ou às dificuldades que a CIA enfrentou em 1975.
3-Nos documentos e na investigação que fez, que factos mais
o surpreenderam na presença e acção da CIA no nosso país?
R-O que mais me surpreendeu na leitura dos relatórios da CIA
sobre Portugal foi a forma condescendente e pouco lisonjeira como os espiões
americanos trataram os portugueses. Os documentos sugerem que a CIA se sentiu
muitas vezes frustrada com a atitude dos políticos nacionais, nomeadamente
Salazar. Para os americanos, o ditador era teimoso e anacrónico, devido à sua
insistência em manter um império do século anterior, que não tinha qualquer
hipótese de sobreviver no contexto político existente. Portugal era descrito
nos relatórios dos anos 50 e 60 como um país invulgarmente atrasado, pobre e
provinciano, dado a lirismos que os americanos não entendiam e que eram olhados
com desdém. Outro elemento que me surpreendeu foi a ideia de periferia, que é
constante nos documentos da agência de espionagem americana dedicados a
Portugal: o nosso País era visto como provinciano, pouco relevante na luta que
verdadeiramente interessava aos espiões, ou seja, quase inútil na Guerra Fria.
Na realidade, para os espiões, tirando a luta contra o comunismo, Portugal era
um aliado pouco fiável, até ligeiramente embaraçoso.
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Luís Naves/Eric Frattini
Portugal Visto pela CIA. Ou como a espionagem americana vigiou o Estado Novo,
Salazar, o Império e a Revolução
Bertrand  17,70€