Lígia Silva: “A tal sabedoria que o tempo nos traz”


1-Como recebeu a notícia de que o seu livro era o vencedor do Prémio Nacional de Poesia de Fânzeres?
R-Com uma felicidade enorme. Emocionei-me. Posso dizer que foi das melhores sensações que tive na minha vida.

2-Qual a ideia que esteve na base deste livro?
R- A liberdade, a criatividade, a paixão, o desejo, a saudade, o corpo, a vida e tudo o que ela engloba. Sobretudo a liberdade, viver em pleno aquilo que sou, aquilo que sinto e passa-lo para o papel. É fundamental para mim ser-me fiel. Embora parece um conceito fácil, não o é para muitas pessoas. O medo do que os outros vão pensar, ou do que vão dizer. O medo do ridículo. O medo de falhar. É claro que eu também tenho esses medos, mas nenhum, repito, nenhum, é superior à vontade que existe dentro de mim. Que cresce, caso seja o caso, pois dou-lhe todo o espaço necessário. Queria que as pessoas ao lerem o meu livro se sentissem um pouco mais livres. Queria passar-lhes isso, liberdade. E, amor, também.

3-Este não é o seu primeiro livro: que percurso teve já a sua obra?
R- ama-me devagar mas com urgência é o meu terceiro livro. O mais maduro e, para mim, mais bonito. É preciso viver, para escrever. É preciso passar por muitas experiências na vida, para se ter alguma sabedoria. É preciso cair. É preciso olhar devagar para as pessoas, para o dia, para a noite e para a estrada. Ter a humildade de acolher a felicidade, para assim a desfrutar, e, aceitar que ela pode ser passageira. É preciso mover as coisas de sítio e, além das coisas, movermo-nos também. Movimento e tempo são fundamentais na evolução e construção do ser. Penso que este meu terceiro livro é um reflexo dos meus últimos anos de vida. Eu vivia cada dia como se fosse o último. Tive que abrandar. Hoje, vivo cada dia, como se fosse o penúltimo. É a tal sabedoria que o tempo nos traz.

4-Além de poesia, ambiciona escrever outros géneros?
R- Não sei o dia de amanhã, mas, neste momento, digo que não. A poesia é o caminho e o destino. Duvido que outro género de escrita me preencha desta forma. Eu gosto de nascer e morrer no poema. Ali, naquele curto espaço de tempo. Só assim mato a minha fome de criação. Eu não sei abrandar e, só no poema, posso apenas acelerar.

5-Normalmente, quem escreve também lê muito: quais são os seus poetas preferidos?
R- Tenho uma profunda admiração pelo Fernando Pessoa. É, para mim, o maior génio da literatura. Na poesia, leio muito: Al Berto, Adília Lopes, Eugénio de Andrade, Sophia de Mello Breyner, Natália Correia, Filipa Leal, Matilde Campilho, Mário Cesariny, Jorge Sousa Braga… Portugal é um país rico em poetas. Depois, existe uma mulher, cuja escrita me apaixona: Clarice Lispector. É uma alma com a qual me identifico totalmente. Adorava ter tomado um chá com ela.

6-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R- Escrevo o presente. Há uma presença na minha vida que me toca de forma especial. Que suaviza as minhas horas. Quero eternizar esta minha admiração e este meu amor. Mostrar-lhe que, num ano difícil como este que todos estamos a viver, a alma dela está a salvar-me.
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Lígia Silva
ama-me devagar mas com urgência
Elefante Editores  8€
(Prémio Nacional de Poesia da Vila de Fânzeres/2020)

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