Júlio Henriques | Flauta de Luz – Revista
1-O que é o projecto da revista «Flauta de Luz»?
R- A ideia que preside a esta iniciativa consiste em fomentar um diálogo subversor da lógica imanente ao presente sistema imperial, que é o império da mercadoria e da redução dos seres humanos a coisas quantificáveis. Como digo no mais recente número editado, esta revista pretende estabelecer relações críticas entre dois sinais profundamente contrários visíveis no mundo contemporâneo: por um lado, a resistente permanência das ancestrais culturas indígenas (a mais importante minoria mundial, cerca de 370 milhões de pessoas, também presente na Europa) e, por outro, o destravado desenvolvimento da sociedade industrial como superorganismo tendencialmente totalitário.
2-Apesar de haver uma identidade, a revista acolhe nas suas páginas textos muito diversos: é essa a sua matriz estruturante?
R- A diversidade que notou espelha a multiplicidade das acções de resistência ao mais frio dos monstros que ocorrem no mundo contemporâneo, em todos os continentes. Este monstro, o Estado, resulta da simbiose entre as forças ditas governativas, que detêm o monopólio da violência, e as corporações empresariais que se apropriam, simultaneamente, dos corpos humanos, a que se chamam «recursos humanos», expressão criada pelo nazismo, e do corpo vivo da Terra. Dada a variedade das acções em causa, que abarcam a resistência, prática e teórica, em contextos urbanos, rurais e silvestres, a sua expressividade é necessariamente diversa.
3-No recente Nº 5 (Abril de 2018), quais os temas em destaque?
R- Embora a correlação entre tudo o que se publica nesta revista, incluindo as ilustrações, seja estrutural, não havendo pois aqui uma hierarquização temática, destacaria neste número as colaborações brasileiras, mexicana e quebequense sobre a actualidade do movimento indígena, os ensaios de autores portugueses sobre a crítica da cultura industrial e tecnicista (Ana Marques, Jorge Leandro Rosa, Álvaro Fonseca, António Cândido Franco, Maria de Magalhães Ramalho, Paulo Barreiros), o trabalho de fundo – o primeiro publicado entre nós – do jovem cineasta Pedro Fidalgo sobre a dimensão estratégica do vitorioso movimento de oposição ao aeroporto de Notre Dame des Landes, em França, o ensaio da feminista curda Dilar Dirik sobre a pujante (e grandemente censurada) revolução social em curso em Rojava, a longa entrevista com Anselm Jappe sobre «Emancipação ou barbárie», e ainda o ensaio de John Zerzan sobre os ludditas e os seus herdeiros no mundo presente.
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