José Viale Moutinho | Livro Português das Fábulas

1-Como lhe surgiu a ideia de organizar esta antologia, «Livro Português das Fábulas»?
R-Esta obra faz parte de um projecto muito mais vasto, em que pretendi figurar
o que de melhor se tem produzido em Portugal no que respeita à Literatura
Popular. O início já tem mais de vinte anos, com um volume antológico de Contos
Populares Portugueses, que surgiu na colecção de bolso de Publicações
Europa-América, cinco ou seis edições esgotadas. Seguiu-se um volume de
Adivinhas Populares Portuguesas, cuja sétima edição é da Casa do Livro. Este
volume não é antológico mas de recolha da totalidade dos materiais encontrados,
com as variantes detectadas. E para encerrar aquilo que poderá ser tomado como
uma realização de volumes não seriados, organizo Portugal Lendário, em que ela
primeira vez surge a cobertura de todos os municípios portugueses representados
com as suas principais lendas. Este livro foi solicitado para reedição pelo
Circulo de Leitores, tendo alcançado um volume de lendas invulgar. Acontece
então a organização de uma obra em quatro volumes que constituiu como que o
culminar do projecto: um quarteto dividido em três partes: um conjunto de dois
volumes intitulado À Lareira, que é uma antologia da literatura popular de
algum modo canónica. Inclui contos populares, adágios, adivinhas, orações
populares, teatro popular, romances, etc. O titulo constitui uma homenagem a
Trindade Coelho, cujo conto homónimo (incluído em Os Meus Amores), é uma
interessantíssima visão ficcionada dessa maravilhosa expressão popular
diversificada que se expandia à lareira! Quando criança assisti em semelhantes
reuniões familiares e de vizinhança! Os outros dois volumes correspondiam à
Literatura de Cordel – de que Arnaldo Saraiva tem sido um excelente divulgador
e campeador – e de que eu tinha em temos dado sinais através de um livrinho com
materiais humorísticos do género. Fecha-se o projecto com este volume O Livro
Português das Fabulas. Inicialmente foi-me encomendado por uma editora algo
como 100 Fábulas de La Fontaine, tendo eu recorrido a traduções de autores
portugueses dos séculos XVIII e XIX. E ao realizar esse trabalho fui ao
encontro dos fabulistas portugueses que, tradutores do francês, influenciados
por ele, tiveram também produção própria. É quando surge a ideia inicial deste
livro. E dentre esses, encontro autores – como Bocage, por exemplo – que não
deviam nada a Esopo nem a La Fontaine, salvo a ideia de fábula. E inicio uma
investigação sistemática, levantando autores insuspeitados, de Fernão Lopes,
que germinou essa fábula, que publico, entre as páginas de uma das suas
crónicas, ao inesgotável Fernando Pessoa. Entre estas balizas estão autores que
não eram considerados fabulistas e cuja inclusão pode surpreender. E ainda bem.
Infelizmente, em Portugal não houve seguidores de uma corrente que arranca
ainda em La Fontaine que é a das fábulas fesceninas, que não estão traduzidas
nem divulgadas entre nós! Também seria interessante restaurar o movimento
fabulístico de Pessoa até aos nossos dias.
2-A antologia reúne autores tão diversos como Fernando Pessoa e Fernão Lopes:
que critérios estabeleceu para a sua escolha?

R-Ora, conforme procurava fábulas nas obras dos autores,
achava-as e arquivava-as. Ao chegar a Pessoa, tive a surpresa de uma pasta
enorme com o material recolhido. Refiz a pesquisa entre os achados e fiquei com
esta escolha. Com esta escolha e quatro ou cinco antologias individuais de
fábulas que mereciam entrar imediatamente no mercado.


3-Enquanto leitor, quais são os autores de fábulas que mais o surpreenderam
quando estava a organizar esta antologia?

R-Bocage chama a atenção logo nas traduções! O seu português recria fábulas de
La Fontaine que merecem a melhor das nossas atenções. Curvo Semedo, Filinto
Elísio, Sá de Miranda, Garrett, O’Neill, o padre Manuel Bernardes, tantos
outros.
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José Viale Moutinho
Livro Português das Fábulas
Temas e Debates  19,90€