José Filipe Pinto | Populismo e Democracia


1- De que trata este
seu livro «Populismo e Democracia: Dinâmicas Populistas na União Europeia»?
R- O livro é composto por duas partes. A primeira procura saber o que é o populismo. Para tal, faz
uma viagem teórica pelo conceito e desmonta os mitos que lhe estão associados
antes de avançar com uma definição própria de populismo. Uma definição assente
na luta pela hegemonia. Uma luta que exige a criação de um antagonismo entre a
elite e o povo, duas construções apresentadas como homogéneas, e a passagem de
uma lógica diferencialista para uma lógica equivalencial. A segunda parte do
livro recorre ao cruzamento do Índice de Democracia com o Índice de Populismo
Autoritário para apresentar a realidade do populismo nos 28 membros da União
Europeia e perceber se o populismo representa uma ameaça para a democracia ou,
pelo contrário, se pode ou deve ser visto como uma oportunidade para um regime
que não tem sabido corresponder aos anseios dos cidadãos.

2- Para os mais distraídos, o populismo começou a ganhar
contornos de realidade com a eleição de Donald Trump mas é um fenómeno antigo:
onde situa a sua origem?
R- O pai do populismo foi Herzen, inspirado na tentativa de trazer para a
Rússia de Nicolau I as ideias dos socialistas utópicos ou idealistas franceses,
como Proudhon, Saint-Simon ou Fourier. Uma tentativa de não ver repetida na
Rússia a miséria gerada no Ocidente pela revolução industrial. No entanto, o berço do populismo varia consoante o populismo
for visto como o irmão gémeo da democracia ou o seu filho bastardo. Na minha leitura, o populismo é tão antigo como a democracia
e, por isso, também nasceu na Grécia Clássica. A existência de instrumentos
para a preservação da democracia – de que a condenação ao ostracismo poderá
representar um bom exemplo – evidencia que democracia e demagogia, uma possível
designação para o populismo inicial, tiveram assento batismal na mesma altura.

3- Uma revelação do seu livro: em 2016, Portugal estava
entre os países com maior Índice de Populismo Autoritário. Como se manifesta
esta realidade e que poderá acontecer num futuro próximo?
R- Na União Europeia Portugal ocupa o 11.º posto no que concerne ao Índice de
Populismo Autoritário, um índice da responsabilidade de Andreas Heinö e que
toma em linha de conta o total de mandatos e a participação no governo. No
nosso país a direita é responsável por 0,5% e a esquerda por 20%.  Este valor representa um acréscimo muito
significativo relativamente a 2000, pois, nesse ano, o populismo em Portugal
não passava de 12,2%. As forças populistas mais significativas em Portugal são
o Bloco de Esquerda – populista autoritário – e o Partido Comunista Português –
populista totalitário – sendo que a coligação do PCP com o PEV, a CDU, também é
populista autoritária. De assinalar que estes três partidos assinaram acordos
separados com o Partido Socialista no sentido da viabilização do atual governo
do PS liderado por António Costa, mas essa situação ainda não é contemplada no
Índice de Populismo Autoritário. No que concerne ao populismo, Portugal está longe das
elevadas percentagens dos países onde partidos populistas lideram o governo – o
FIDESZ na Húngria, o Pis na Polónia e o Syriza na Grécia – mas também está
muito afastado de Estados da União Europeia onde não existe populismo ou onde o
seu valor é residual: Malta, Luxemburgo, Eslovénia, República da Irlanda… Portugal
fica próximo da Espanha, da República Checa e da França. Ora, ainda não se
calaram os ecos do perigo que representava o populismo de Marine Le Pen e da
sua Frente Nacional para a França e para a União Europeia na recente eleição
presidencial francesa. Sendo certo que 20,5% de populismo não é suficiente para
que Portugal deixe de ser considerado como uma democracia – o Índice de
Democracia era 7,86 em 2016, bem na primeira metade das democracias imperfeitas
– há que acompanhar com cuidado a evolução do populismo no nosso país. Porém,
também aqui as posições divergem. Há cientistas, como Chantal Mouffe, a
conselheira ideológica do PODEMOS e do Syriza, que defendem a necessidade de
mais populismo de esquerda para combater o populismo de direita. Há outros
estudiosos que continuam a ver o populismo, tanto de esquerda como de direita,
como uma ameaça. Na minha opinião, há duas dimensões a contemplar no populismo:
a existência e a intensidade.  A primeira
não é questionável. A natureza impõe-se à condição humana. O nível alcançado
pela segunda aconselha ao mea culpa por parte dos representantes eleitos. Uma
condição necessária. O futuro dirá se suficiente.
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José Filipe Pinto
Populismo e Democracia: Dinâmicas Populistas na União
Europeia

Edições Sílabo, 21,90€