José Carlos Barros (Prémio LEYA 2021): “Na origem deste livro esteve um acaso”

1-O que representa no contexto da sua obra o livro «As Pessoas Invisíveis»?
R-Este livro começa por chamar a atenção para o que escrevi antes de vencer o Prémio. E isso é importante, porque talvez possibilite uma revisitação de textos que são praticamente desconhecidos. É o que espero que, sobretudo, venha a representar. Porque não tenho propriamente ‘uma obra’. O que acontece é que ao longo dos anos, espaçadamente, a intervalos irregulares, foram publicados alguns livros meus de poesia, sempre em tiragens muito reduzidas e sem distribuição comercial. Só em 2009, pela primeira vez, com «O Prazer e o Tédio», isso aconteceu. O romance, de resto, recebeu críticas muito elogiosas, mas não deve ter vendido praticamente nada: a primeira edição, passados todos estes anos, ainda não esgotou… Em 2013 publiquei um novo romance, que foi finalista do Prémio LeYa («Um Amigo para o Inverno») e, no ano seguinte, um livro de poemas que, com duas edições, levou a minha poesia a um conhecimento um bocadinho mais alargado: «O Uso dos Venenos», editado pela Língua Morta. E a isto se resume, pois, a minha ‘obra’…

2-Qual a ideia que esteve na origem deste livro?
R-Na origem deste livro esteve um acaso: o acaso de, em 2011, na Bienal de São Tomé, ver uns painéis sobre o massacre de Batepá. Aí se descreviam os acontecimentos de Fevereiro de 1953, em São Tomé e Príncipe, em que terão morrido mais de mil pessoas. Verdadeiramente surpreendente, para mim, era o facto de nunca ter ouvido falar nisso. Como se pudesse ser normal desconhecermos episódios históricos como este, com esta relevância… Mas mais surpreendido fiquei quando, procurando bibliografia sobre o assunto, descobri que o massacre tinha ainda ligação à questão do trabalho escravo. De facto, os acontecimentos estão ligados à recusa dos filhos da terra se sujeitarem ao que podemos designar por ‘trabalho escravo’, não obstante a escravatura ter sido oficialmente abolida mais de sete décadas antes… O assunto era conhecido, e, aliás, denunciado no interior do próprio regime do Estado Novo. Só a título de exemplo, em 1947, na Assembleia Nacional, em sessão secreta da Comissão das Colónias, era discutido um Relatório de Henrique Galvão em que se descreve uma «situação insustentável em que só os mortos estão isentos da compulsão ao trabalho» e se denuncia uma realidade «mais grave do que a criada pela escravatura pura». Tudo isto foi, para mim, verdadeiramente surpreendente, e é a partir destes acontecimentos que parti para a escrita de um texto que pretende ser, no essencial, um olhar alargado sobre o período do Estado Novo.

3-Que significado tem para si a atribuição do Prémio LeYa/2021 a este seu livro?
R-O Prémio tem um impacto mediático grande e permite chamar a atenção para alguns livros mais antigos, no essencial sem distribuição comercial e quase nula visibilidade. Isso, essa revisitação que permite, parece-me o mais importante.
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José Carlos Barros
As Pessoas Invisíveis
Prémio LEYA 2021  16,60€

José Carlos Barros na “Novos Livros” | Entrevistas

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