John Berger: histórias e retratos

Crónica
| Rui Miguel Rocha

Acabo “Fotocópias” do John Berger na Antígona com tradução da Inês Dias.
Adoro estes livros que não conseguimos parar de ler até chegarmos ao fim que não queríamos que chegasse. São vinte e nova histórias/retratos de alguém com quem o autor alguma vez se cruzou, mesmo no caso de ter visto a personagem numa fotografia num jornal ou a meio de um livro. Alguns conhecidos como Cartier Bresson e Simone Weil, outros desconhecidos, quase todos com grande apego à arte e à terra.
Comecei por gostar dos títulos, como se de pinturas se tratassem (e não serão?): “Mulher com um cão no colo”; “Dois cães debaixo de uma rocha”; “Uma mulher de bicicleta”; Uma rapariga como Antígona”…
E depois os retratados: uma mulher “magra e firme como as pessoas que vivem perto de cavalos”; e outra ainda que quando “entrava numa sala cheia de gente, tinha uma arrogância quase bizantina” e que tinha um “riso…leve e argentino” que contou uma anedota sobre os homens pararem os relógios antes de irem para a cama para assim durarem mais. Mas também a cerejeira que “Nasceu sozinha um ano depoi da morte da Mãe. Quando ela estava viva, tinha o hábito de cuspir os caroços de cereja pela janela da sala de estar.” E ainda “uma vagabunda sem necessidade de pedir, mas com necessidade de dar.” E, claro, Cartier-Bresson (ao ler este livro a nossa fotografia trazida da exposição no MoMa há dez anos, caiu com estrondo do prego mal amanhado onde o pendurei há pouco tempo) “que escapou três vezes de uma campo de prisioneiros de guerra na Alemanha”, caçou em África e depois tornou-se num “budista e anarquista independente” (de certa forma num percurso inverso ao de Rimbaud) com o seu “tratado zen sobre o tiro com arco” (também comprei um arco para os meus filhos há pouco) e a elegância, como dizem os matemáticos e físicos “se uma abordagem é elegante, pode estar mais próxima da verdade.”
Mas também Barcelona, o calor infernal: “a única maneira de esquecer o calor – para os que podem – é fazendo amor!” Ou Atenas com os seus “pequenos prazeres: colher flores de manhã, trazê-las para casa e colocá-las numa jarra. Cortar com uma faca afiada. Lavar a cara com água fria depois de dormir. Receber uma carta de alguém amado.”
Acabo com a frase da contra-capa de Bresson “nada se perde, tudo o que vemos permanece connosco.”
E eu que sou esquecido…
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John Berger
Fotocópias
Antígona  16€

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