Joaquim Miranda Sarmento: “Portugal está estagnado há 20 anos”
1-Qual a ideia que esteve na origem do livro «Portugal-Liberdade e Esperança. Uma Visão para Portugal 2030»?
R- A preocupação de que Portugal está estagnado há 20 anos, continua a ser um país relativamente pobre no contexto Europeu e, nestes últimos 20 anos, tem sido ultrapassado por quase todos os países do Leste Europeu que entraram na União Europeia, e que eram todos bastante mais pobres que Portugal no início do século XXI. A somar a isso, que na minha opinião resulta de três grandes fatores (baixa qualidade das Instituições; baixa qualificação do Capital Humano; “estrangulamentos” da competitividade e produtividade da economia), soma-se a grande ameaça, que já está entre nós, que é o “inverno demográfico”, a quebra da população e o seu envelhecimento. Isto tudo, num contexto em que o Partido Socialista governou 18 dos últimos 25 anos e o PSD/CDS governou 7, mas sempre em emergência financeira (entre 2002-2004 com um défice excessivo e entre 2011-2015 com um programa da Troika até 2014).
2-Ao longo do livro, fica claro que considera a falta de crescimento da economia como o grande problema de Portugal: quais as principais razões deste problema?
R- Existem um conjunto de “estrangulamentos” da competitividade e da produtividade da economia Portuguesa. Temos uma economia pouco competitiva e com um baixo nível de produtividade. Esses “estrangulamentos, que estão identificados há muitos anos e são relativamente consensuais entre economistas e gestores (o diagnóstico dos problemas está feito) e são sobretudo: Custos de contexto e burocracia; Um sistema fiscal instável, complexo, com elevados custos de cumprimentos e uma elevada carga fiscal sobre as famílias e as empresas; Uma Justiça lenta e ineficiente; Um mercado laboral dual e rígido, com muitas distorções; Falta de capital humano qualificado em diversos setores; e três problemas transversais às empresas e aos diferentes setores: as empresas têm baixa dimensão, baixa capitalização (muito endividadas) e baixa internacionalização).
3-Apresenta no livro os quatro grandes eixos da sua visão para o Portugal 2030 (Reforma das Instituições, Educação e Capital Humano, Competitividade da Economia e Demografia). Ainda vamos a tempo de ter um outro Portugal num prazo de apenas 9 anos?
R- Podemos, e devemos, começar rapidamente as reformas estruturais que Portugal carece. Quanto mais tempo demorarmos, quanto mais tempo estivermos na situação destes últimos anos, sem qualquer ímpeto reformista, apenas a gerir a conjuntura, agarrado a uma dívida pública (e externa) muito elevada, beneficiando dos efeitos da política monetária do BCE e em breve da “Bazuca”, mais Portugal continuará a empobrecer e a atrasar-se face aos seus concorrentes. Se nos próximos 2-3 anos nada for feito, será mais uma década perdida. Com a agravante que o problema demográfico ter-se-á tornado quase irreversível e não aproveitámos as enormes oportunidades que a disrupção tecnológica e a digitalização, que abordo no livro. Mas mesmo que iniciemos em breve as reformas estruturais que Portugal necessita, levará muito tempo e exigirá coerência e estabilidade, eu diria compromissos, nas políticas públicas.
4-Finalmente, apresenta 8 grandes e decisivas reformas estruturais indispensáveis para o desenvolvimento do nosso país. Se pudesse decidir hoje, por onde deveríamos começar?
R-São as 8 bastante relevantes, mas aquele que é porventura mais fácil, com medidas mais rápidas e que produz resultados mais rápidos também seria a reforma fiscal. Por outro lado, a reforma das Finanças Públicas, nomeadamente na gestão financeira do Estado é condição necessária para se realizar um conjunto de outras reformas e tornar o setor público mais eficiente.
5-Vivemos mais de quarenta anos de democracia e com sucessivos e variados governos (da direita à esquerda, alguns com maioria absoluta no Parlamento): do seu ponto de vista, que factores têm impedido que se tenham aprovado e concretizado estas reformas estruturais?
R- Portugal teve um período muito reformista entre 1986 e 1995, coincidindo com a entrada na então CEE e duas maiorias absolutas, de um governo que tinha esse ímpeto reformista. Voltou a ter um período com reformas estruturais entre 2011 e 2015, fruto da imposição da Troika, acompanhado de um governo também ele reformista. De facto, o sistema político não parece favorecer reformas estruturais de forma endógena.
6-Considera possível, no curto prazo, encontrar os consensos políticos para concretizar estas reformas?
R- Espero que sim, sob pena de condenarmos Portugal a mais 10-15-20 anos de estagnação e de nos tornarmos, nesse espaço de tempo, os mais pobres da Europa. Se os nossos políticos não forem capazes de encontrar esses consensos para realizar estas reformas estruturais, então terão colocado os seus interesses pessoais e partidários, e o seu desejo de se manterem no poder, à frente dos interesses de Portugal. Quem pagará essa fatura será a geração que tem agora entre os 40 e os 60, que verá cada vez mais os jovens a abandonar o país, e terá grandes dificuldades no final da próxima década, quer de sustentabilidade do país e do Estado, quer de níveis de pobreza muito elevados.
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Joaquim Miranda Sarmento
Portugal-Liberdade e Esperança. Uma Visão para Portugal 2030
Bertrand 17,70€