João Tordo: manual de sobrevivência de um escritor
P-Qual a Ideia que esteve na origem deste seu novo livro «Manual de Sobrevivência de um Escritor»?
R- Não foi uma ideia, antes um conjunto de reflexões acerca do processo da escrita que foram surgindo ao longo dos anos. Escrevi as primeiras em 2013, 2014, e fui tirando notas e apontamentos. Alguns dos capítulos são melhorias e acrescentos a textos lidos em conferências, outros completamente originais. O que me importava era o ofício da escrita e a minha relação pessoal e íntima com aquilo que faço, de que se fala pouco. Quis abordar o tema sem complexos, com a ressalva de que ainda sou um escritor a meio da carreira, portanto sei pouco sobre o que faço…
P-Pensando no seu percurso pessoal: quais teriam sido os bons conselhos que gostava de ter recebido no início da sua carreira de escritor?
R- Talvez ter menos pressa e deixar que o processo evoluísse organicamente. Mas como é que vais dizer a um tipo com vinte e tal anos que não tenha pressa? É uma quimera. Também teria sido bom ouvir que, nisto da escrita, não há competição nem ninguém é melhor do que ninguém, e que o ofício de um escritor é escrever; se dedicares 70% do teu tempo à escrita e 30% ao resto – a promoção, entrevistas, viagens, angústias, dúvidas, parvoíces -, talvez consigas lá chegar. Reverter a ordem das prioridades é meio caminho andado para me tornar num daqueles escritores que publica um livro de cinco em cinco anos, mas fala sem parar. A mim isso não me serve.
P-Que livros de outros escritores gostaria de ter escrito?
R-Os Detectives Selvagens, de Roberto Bolaño, e O Ano da Morte de Ricardo Reis, de José Saramago.
P-O seu processo de escrita está formatado ou varia de obra para obra?
R-Não existe formato possível. Os livros são entidades caprichosas e vão mudando de forma enquanto os escrevermos. Muda tudo: a nossa ideia original, as personagens, o enredo, a metáfora, por vezes até a própria intenção e o ponto de vista. isso está tudo dito no Manual (que não é manual nenhum, enfim…). Se o meu processo de escrita estivesse formatado era melhor aprender outro ofício, talvez um mais rentável – construir guitarras, por exemplo, ou bicicletas -, e mais útil, em que a repetição do mesmo processo produzisse idênticos resultados. Com a escrita isso não existe. O ofício acontece, mas não se aprende.
P-O seu último livro de ficção foi um policial: o que o motivou a entrar neste género?
R-O meu gosto por policiais e a necessidade de escrever alguma coisa que me divertisse, que me desse prazer, distante das ordens subconscientes da “literatura”. Estas ordens são canónicas e estão implantadas na nossa cultura literária. Apeteceu-me pegar no género e perceber o que podia mudar ou acrescentar, como é que eu – o João que escreve “romances literários” – podia funcionar escrevendo um romance sem classificação aparente. Chama-lhe “policial”, mas o protagonista não é um polícia. Também não é exactamente um thriller. É um híbrido.
P-Foi uma experiência enriquecedora e ficou com vontade de voltar?
R-Sim, já voltei. Estou a pensar numa série com uma protagonista que regresse noutros livros. É muito interessante para mim o policial, dá para entrar num lado negro, macabro, perverso da experiência humana que me diz muito sobre essa mesma experiência. É um puzzle, também. Dá para fazer coisas que não cabem num romance “literário”, criar um tipo de tensão diferente, esticar as barreiras do verosímil, do diálogo. E, sobretudo, mostra-me que o ofício me ensinou a montar um esqueleto cambiante, maleável, que é fruto da experiência.
P-Teremos novas aventuras no futuro: comédia, terror, teatro ou poesia?
R- Não.
P-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R- Eu escrevo muito à frente, estou a pensar em coisas para 2022 ou 2023. Para este ano há um romance novo – Felicidade -, que sairá no Outono, e dois livros no ano que vem. Por agora, ando a experimentar com uma ideia antiga, sobre uma família com muitos irmãos, mas ainda não sei o que vai ser ou o que vai dar.
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João Tordo
Manual de Sobrevivência para Escritores ou o Pouco que sei Sobre Aquilo que Faço
Companhia das Letras 15,90€
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