João César das Neves: os olhos de um economista face à pandemia

1-Como é que um economista olha e interpreta um fenómeno tão vasto e abrangente como esta pandemia?
R- Os economistas estão habituados a lidar com fenómenos vastos e abrangentes, da revolução industrial à globalização, da grande depressão à crise financeira global. Este caso tem certas características únicas que, certamente, farão dele um tema de múltiplos estudos nos próximos anos, e será fonte para muita investigação e aprendizagem.

2-Já é possível fazer uma análise prospectiva da actual pandemia e suas consequências futuras?
R- A resposta é claramente negativa. O drama ainda não acabou, pelo que nem sequer podemos fazer um balanço, quando mais uma prospectiva. Multiplicam-se as antevisões, das mais dramáticas às mais descontraídas, mas todas elas mantêm-se meramente especulativas. É provável que o mundo continue, e que continue de forma parecida com aquilo que era antes da pandemia, embora certamente com alterações inevitáveis.

3-Sempre que ouvimos falar da actual situação, as palavras mais usadas são «crise”, «global” e «catástrofe”: como pode um pequeno país como Portugal, num mundo cada vez mais global, fazer deste enorme desafio uma oportunidade?
R- Este choque é eminentemente negativo. No entanto, até as piores desgraças têm efeitos positivos. É verdade que esta situação abalou muito do que considerávamos seguro, e obrigou-nos a fazer coisas que nunca pensávamos possível. Um dos casos mais evidentes viu-se na União Europeia, onde o novo Fundo de recuperação pretende ser protagonista do mundo pós-Covid, fazendo importantes reformas estruturais. Portugal terá na sua proverbial capacidade de flexibilidade e improvisação um trunfo precioso para iniciar uma nova fase do seu desenvolvimento. Se conseguirmos avançar nas possibilidade agora abertas, sobretudo vencedo velhos atavismos e interesses que nos têm prendido, esta pandemia poderá ser uma excelente oportunidade. Mas temos de dizer que tem sido chocante ver como as velhas forças de bloqueio se têm organizado para manter o seu poder nas novas condições.
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João César das Neves
As 10 Questões da Pandemia
Publicações D. Quixote

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