João Barbosa: “Ninguém está triste porque quer”

1-Qual a ideia que esteve na origem deste seu livro «A Esperança é mesmo o Farol»?
R-Enquanto doente, tentei sempre, quando aconteceram oportunidades – nunca assumindo um papel de doutrinador ou pregador –, desfazer algumas ideias erradas. Registei uma clara melhoria, no primeiro semestre de 2018, o que fez o meu editor na Leya, Francisco Camacho, desafiar-me a partilhar a minha experiência. Tentar, num momento mais sereno, publicamente alargar o número de pessoas a quem possa clarificar situações equívocas – sempre no ponto de vista de quem sofre da doença e nunca como profissional de saúde, porque não o sou. Inicialmente recusei, mas o argumento do editor, de ser coerente com o meu empenho em desmontar alguns mitos, e a insistência de amigos levaram-me a aceitar falar da depressão – sempre e somente no que a mim diz respeito. Ou seja, um caso particular que possa mostrar que não se está sozinho e que é possível ser auxiliado, se se procurar ajuda profissional.

2-Muitas pessoas já tiveram fases depressivas. Mas como é viver na depressão durante muitos anos ou «desde sempre», como refere?
R-Antes de mais, há que referir que nem todas as depressões chegam a uma gravidade extrema. Tal como acontece com a generalidade das doenças. Todos, ao longo da vida, passamos por momentos prolongados de tristeza. Para ser correcto, não vou assumir o risco de estabelecer o limite entre esse momento prolongado de tristeza – mais alguns outros sentimentos específicos – e a depressão. Não corro esse risco, porque não sou profissional, fazê-lo poderia estar a desajudar em vez de contribuir para o esclarecimento das pessoas. Eu, que identifico o começo da depressão aos 13 anos – talvez tenha até sido antes –, não a vivi sempre do mesmo modo ou intensidade. Embora precoce, o ponto mais baixo tem um começo que identifico claramente, já na idade adulta. É igualmente necessário salientar que o modo como se vive a depressão não é o mesmo em todas as pessoas. Há quem se encerre em casa, fique apática e desinteressada em «tudo». Há quem seja inteiramente funcional. Sou absolutamente funcional. Mesmo nos momentos mais «baixos» fiz a minha higiene, fui trabalhar, estive com amigos, fiz compras no supermercado, cuidei das minhas gatas, etc. É de referir também que alegria e felicidade não são a mesma coisa, mas quase sempre são confundidas. Costumo dar o exemplo do ácido, ou seja, o amargo e o azedo. O primeiro é compatível com o doce, como o limão, e o outro é o estragado. Sou uma pessoa alegre e bem-disposta. Contudo, tenho tido uma vida atormentada. Acresce que há outra situação relevante, que é a confusão entre o ter uma vida «perfeita» e uma existência imperfeita. Não é incomum sabermos de pessoas que se suicidam quando «tinham tudo para serem felizes». Gosto de citar uma frase (não é minha) que é certeira: «o suicida não foge da vida, foge da dor». É fundamental saber isto.

3-De que forma este livro pode ajudar outras pessoas com experiências de depressão?
R-Tento mostrar que não se está sozinho, que mais pessoas estão em circunstâncias semelhantes, nem como doente nem como amigo ou familiar. Que tem de haver esperança, porque há razões para se ter esperança. Comprometi-me que este não seria um livro de auto-ajuda, mas um livro que espero que ajude alguém. Por isso, não dou conselhos para além do de se procurar ajuda profissional, seja o próprio ou quem convive em proximidade – familiares e amigos. É muito importante identificar o que são os disparates que se dizem acerca da depressão – seja pelas palavras ou pelo tom com que se dizem. Dizer que «está um dia lindo e que só não o aproveita quem não quer» é injusto porque cruel. É insultuoso, porque o sofrimento não tem nada a ver com o dia lindo. Algo como os vencedores vivem celebrando mesmo quando chove horrores e o céu está da cor do chumbo e outros – os tristes e tolos – não festejam os dias lindos e soalheiros. As frases motivacionais podem ser escritas com as mesmas palavras e sequência, mas o modo como se dizem faz toda a diferença. Um modo é caloroso e outro é cruel. Ninguém está triste porque quer. Reconhecer esta verdade, diante de alguém que está em profundo sofrimento, é uma prova de amor e compreensão. É igualmente importante saber e reconhecer que quem está próximo do doente também precisa de ânimo, porque está em dor ao ver alguém, de quem se gosta, viver um grande sofrimento. Estas pessoas podem, ou devem, socorrer-se com profissionais de saúde.
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João Barbosa
A Esperança é mesmo o Farol
Oficina do Livro  13,90€

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