Isabel Nery: Sophia de Mello Breyner Andresen
R- Foi uma bela aventura, que me levou até à Grécia, ao Algarve, à Granja e ao Porto, mas também a ouvir cerca de 60 testemunhos. Desde alguma família, grandes amigos, como Manuel Alegre e Graça Morais, até tradutores e especialistas na obra, assim como o pescador José Muchacho ou empregados dos restaurantes que Sophia frequentava. Ou ainda historiadores da ilha de Föhr (antes Dinamarca, hoje Alemanha) de onde o bisavô de Sophia, Jan Andresen, veio para Portugal. Foi um trabalho profundo, de investigação, por isso, a somar ao que já referi, pesquisei arquivos, como os da PIDE, na Torre do Tombo, ou os arquivos da Presidência da República, o espólio da Biblioteca Nacional, assim como artigos de jornal e textos escritos sobre Sophia. O objetivo era chegar a uma visão o mais abrangente possível da autora, que me permitisse revelar uma Sophia completa, nas suas diferentes facetas (criança, mulher, mãe, amiga, poeta, política).
2-Durante a sua pesquisa sobre Sophia de Mello Breyner Andresen, ficou surpreendida com algum aspecto da sua vida?
R- Talvez o mais surpreendente, porque completamente desconhecido até aqui, seja o facto de Sophia ter entrado na Faculdade de Letras de Lisboa (em Filologia Clássica) com uma média relativamente baixa de 12 valores. O génio literário que lhe é reconhecido levaria a pensar que poderíamos estar perante uma aluna genial. No entanto, este dado é, ao mesmo tempo, coerente com a personalidade de Sophia, desde sempre avessa a formalismos e formatações, especialmente aqueles que a escola impunha no tempo da ditadura. Por outro lado, este detalhe é também muito interessante por revelar o rigor na sua postura pública. Ao tornar-se deputada da Assembleia Constituinte, a informação que consta na ficha parlamentar indica nas habilitações literárias: «primeiro ano incompleto».
3-A biografia que escreveu é, também, um livro sobre a história de Portugal que Sophia viveu e em que se empenhou?
R- Foi uma decisão que tomei relativamente cedo no processo de biografar Sophia. Pareceu-me difícil entregar aos leitores da biografia uma poeta descontextualizada do seu tempo, ou até do tempo que a precedeu. Como poderíamos compreender uma autora se não notássemos que nasceu um ano depois da primeira Guerra Mundial, que cresceu num país pobre e analfabeto e se fez adulta desejando a liberdade num território sujeito à ditadura e à guerra colonial?
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Isabel Nery
Sophia de Mello Breyner Andresen
Esfera dos Livros 22€