Hugo Mezena | Gente Séria

1-“Gente Séria” é o seu primeiro romance: como espera poder olhar para ele daqui a 20 anos?
R- Neste romance, há uma sociedade rural que, na transição para os anos noventa, tem ainda muitos dos tiques do antigo regime: o atavismo, a resistência à mudança. E a violência. A violência das coisas do dia-a-dia, dos pequenos gestos, dos olhares. A incapacidade de lidar com os sentimentos, as frustrações e a diferença. É a história do crescimento de um rapaz e de como o olhar dele sobre tudo isto se vai alterando. O 25 de Abril demorou muitos anos a chegar ao interior do país. O texto olha esse espaço e esse “tempo fora de tempo” e procura fixá-los, vinte anos depois. Para que não fique esquecido e porque um olhar distanciado é sempre uma forma boa de tentar ver as coisas. É interessante pensar como se olhará para o que lá se retrata daqui por outros vinte.
2-Qual a ideia que esteve na origem deste livro?
R- Parto sempre para a escrita sem nada definido. É a mão que manda. E só aqui ou ali vai aparecendo alguma coisa que merece a minha atenção. É como os desportistas: fazem cinquenta vezes um exercício e apenas numa delas o movimento é realizado como deve ser. E é o melhor movimento pode valer a pena apresentar às outras pessoas. A diferença entre este romance e os que terminei anteriormente, e não publiquei, foi que, ao fim de duas ou três semanas, percebi que havia alguma coisa que estava a correr bem. Alguma coisa que funcionava. Parecia que o texto criava um tipo de comunicação que me interessava. Só isso. A comunicação interessa ou não interessa. Quando falamos com alguém, temos uma sensação parecida: interessa ou não. Interessa o que diz e a forma como diz. Não há uma fórmula para isto.
3-Pensando no futuro: o que está a escrever neste momento?
R- Na minha pasta de computador e nos meus cadernos, há muita coisa em crescimento. Alguns textos estão prontos, à espera de serem transformados em livro. Outros estão numa fase intermédia, a aguardar que olhe para eles e decida se são bons para publicar. É uma espécie de purgatório. Outros estão destinados a não ver a luz do dia. Não costumo trabalhar de acordo com um projecto, pensar que vou fazer desta ou daquela maneira, visualizar o livro antes de ele existir. É um método como outro qualquer. O meu método. Mas há narrativas curtas, romances e outras coisas às quais para já ainda não sei dar um nome. E há a leitura. Acima de tudo a leitura. A leitura é muito importante para mim.
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Hugo Mezena
Gente Séria
Planeta  17,76€