Gustavo Carona: “O maior desafio colectivo da nossa sociedade dos tempos modernos”
1-Qual a ideia que esteve na origem deste seu livro «Diário de um Médico no Combate à Pandemia»?
R- Queria que ficasse um registo para todo o sempre sobre o maior desafio colectivo da nossa sociedade dos tempos modernos. A maioria das pessoas nunca compreenderá o que se passou nos hospitais para além dos números. Dos doentes aos seus familiares, até aos profissionais de saúde, vivenciaram-se tempos de emoções muito fortes que nos abalaram a nossa estrutura, com muita mágoas, mas também muitas vitórias e muitas aprendizagens. A inteligência emocional é a maior arma para a nossa sobrevivência e é algo que só se aprende vivendo. E este livro permite as pessoas viveram e absorverem as aprendizagens que daí resultam.
2-Todos nós vivemos este pesadelo da vida com COVID 1, mas não tão intensamente como um profissional de saúde que esteve na linha da frente: o que foi mais marcante para si enquanto médico e enquanto pessoa?
R- Nós profissionais de saúde tivémos que dar mais de nós, numa altura em que os nossos pilares de equilíbrio, família, amigos, socialização, estavam também comprometidos. Sabíamos que todo o país dependia de nós e queríamos muito estar à altura do desafio. Mas ver doentes a sofrer sozinhos nos hospitais, e sentindo que a nossa capacidade de resposta por mais que tivesse sido desmultiplicada não seria infinita, levou a um grande sofrimento ético. Para quem tem o imperativo moral de salvar vidas, é muito doloroso sentir-se que não poderíamos dar tudo a todos, e mais ainda numa doença que é extremamente lenta na sua evolução e que obriga os doentes a estar longe das suas famílias. O que mais me marcou foi as muitas conversas emotivas, algumas tristes outras alegres, com os familiares ao telefone na partilha da evolução clínica dos seus entes queridos.
3-Nas suas muitas horas de trabalho durante a pandemia, o que mais o surpreendeu nos doentes que ajudou a tratar?
R- Do ponto de vista médico o que mais me surpreendeu foi a extrema gravidade que esta doença pode ter mesmo em pessoas muito novas. O facto de ter uma expressão de gravidade tão heterogénea é surpreendente, assim como a discrepância entre a gravidade da doença pulmonar e a percepção de gravidade por parte do doente. Em muitos casos, o doente não tinha a mínima noção do quão doente estava até chegar ao hospital. Tem contornos muito bizarros esta doença, como revelo em alguns dos meus relatos neste livro.
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Gustavo Carona
Diário de um Médico no Combate à Pandemia
Oficina do Livro 16,90€