Erik Larson e o primeiro ano de Churchill como primeiro-ministro
CRÓNICA
| Rui Miguel Rocha
A não perder. Um relato do blitz sobre a Britânia e a resistência imposta pelos homens certos à hora certa, que é quase como dizer Winston Churchill e família (alguma), com muitas inconfidências e curiosidades retiradas de cartas e diários – até do lado alemão. Larson quis retratar o primeiro ano de Churchill como primeiro-ministro, entre 10 de maio de 1940 e 10 de maio de 1941. Um ano terrível para a Inglaterra, com todas as suas cidades a serem bombardeadas diversas vezes, quase sempre de noite devido a uma vantagem tecnológica dos nazis nos voos nocturnos.
Esperava-se também uma invasão a cada momento (a Noruega já estava ocupada, assim como a Polónia, França e Países Baixos), era só uma questão de tempo. Diversos folhetos eram espalhados pela população: ao serem avistados “paraquedistas nas redondezas… uma pessoa deveria inutilizar a sua bicicleta e destruir os seus mapas. Se tivesse um carro deveria remover a cabeça e correntes do distribuidor e esvaziar o depósito ou remover o carburador.” Neste cenário havia já quem quisesse um pacto com os nazis. Tivemos a sorte de ter este homem e de o povo ser suficientemente arguto para o proteger. Logo a seguir a ser indigitado diz “apenas podemos fazer o melhor possível e dar tudo o que temos – o que quer que nos reste.” Tanto que chegou-se a fiar pêlo de cão para ser usado no fabrico de roupa.
Sabemos das excentricidades de Churchill, são já do domínio da lenda, mas uma coisa é ser excêntrico em tempo de paz, no meio de bocejos e bajulações, outra é sê-lo genuinamente, no meio de uma guerra que seria mais provável perder do que ganhar: “Estava prestes a tomar um dos seus banhos diários, preparados com grande precisão – a água a 36,5 °C e a banheira cheia a dois terços – pelo seu mordomo Frank Sawyers, presente a todo momento…Churchill tomava dois banhos todos os dias, um hábito antigo, independentemente de onde estivesse e da urgência do que estava a acontecer à sua volta, fosse na embaixada em Paris durante uma das suas reuniões com os líderes de França, ou a bordo do comboio ministerial, cuja casa de banho incluía uma banheira.” Ou as suas boutades : “Depois de Clementine certa vez ter criticado Churchill por beber, ele disse-lhe, “Lembra-te sempre, Clemmie, que eu tirei mais proveito do álcool do que o álcool de mim.””
Mas também Hitler e o seu estado maior, o louco, insensato e ladrão de arte Göring, o vice-FührerRudolf Hess que enlouqueceu, pegou num avião e viajou para a Escócia sem regresso (nem na ficção), Himmler, o monstro das SS e um dos responsáveis pelo Holocausto e Goebbels, o génio da propaganda que por vezes nem sabia o que fazer para publicitar tanta loucura encapotada, entre tantos outros, com relatos, cartas e testemunhos de deixar os cabelos em pé.
Também os bombardeamentos, a resistência do povo bombardeado, as batalhas aéreas, Beaverbrook e o fabrico de aviões em tempo recorde, Roosevelt renitente, Roosevelt sem outro remédio. A História contada como se fosse uma história. Não se consegue largar até ao fim.
Deixo-vos sempre e ainda com duas frases de Winston:
“Iremos até o fim. Lutaremos em França, lutaremos nos mares e oceanos, lutaremos com crescente confiança e força no ar, defendemos a nossa ilha, custe o que custar. Lutaremos nas praias, lutaremos nos locais de desembarque, lutaremos nos campos e nas ruas, lutaremos nas colinas: jamais nos renderemos.”“É uma grande vida se não fraquejarmos!”
É por estas e por outras que a suástica passou de moda.
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Erik Larson
O Esplendor e a Infâmia
Publicações D. Quixote 29,90€