Eliane Robert Moraes: “Dar voz a um erotismo que é, antes de tudo, um excesso da imaginação”


[Fotografia: Renato Parada]

1-Qual a ideia que esteve na origem desta antologia “Conto Erótico Brasileiro”?
R-Em 2015, publiquei no Brasil a Antologia da poesia erótica brasileira, editada dois anos depois em Portugal também pela Tinta-da-China, cuja principal fonte inspiradora foi a notável Antologia da poesia portuguesa erótica e satírica lançada por Natália Correia em 1966, em plena era salazarista. Além dessa inspiração de base, o livro foi concebido com a ambição de preencher uma lacuna importante na história literária do país, já que, até então, não havia qualquer compilação da lírica erótica brasileira. A pesquisa me levou a um tesouro oculto, de extraordinária riqueza. Ora, a passagem da poesia para a prosa ocorreu quase que automática, até porque esse domínio tampouco contava com qualquer publicação voltada exclusivamente ao erotismo.  Contudo, logo que comecei a vasculhar desde bibliotecas públicas até coleções particulares na procura de textos eróticos, acumulei uma quantidade tão grande de textos que fui obrigada a me concentrar num só gênero, o conto.

2-Apesar de incluir autores tão diferentes (de Machado de Assis a Dalton Trevisan), esta antologia ambiciona ser representativa do conto brasileiro: que critérios usou para seleccionar os autores?
R-O livro apresenta uma amostra da escrita erótica brasileira desde as últimas décadas do século XIX, quando começou a ser produzida, até as primeiras do século XXI, compondo uma antologia organizada segundo o princípio cronológico. Figuram nela escritores de épocas, estéticas e contextos diversos, cujos textos se alternam entre a sensualidade meramente sugerida e a obscenidade mais provocante. Dois critérios fundamentais orientaram a seleção: de um lado, a qualidade literária dos contos; de outro,  a presença do imperativo sexual, sendo que o grau de sua explicitação varia do licencioso ao alusivo, mas nunca a ponto de este fazer perder de vista o que o outro nomeia sem mais. A coletânea comporta um conjunto que demarca distintas fases da paisagem sensível brasileira, com impacto nas formas com que a literatura aborda o erotismo. Tentei privilegiar ainda os critérios de época e gênero sexual que, uma vez cruzados, permitem deduções interessantes para uma compreensão mais densa da reunião em pauta. É o que se pode deduzir, por exemplo, sobre a presença de autoras do sexo feminino que, ao longo da antologia, passa a ser cada vez mais evidente e expressiva conforme avança o tempo.

3-E como escolheu os 59 contos: foi fácil ou teve uma luta forte entre várias opções em cada autor?
R-Esta foi, sem dúvida a parte mais difícil, mas também a mais apaixonante, do trabalho. A rigor, o resultado da pesquisa, em termos numérico, foi muito maior que este… Cheguei a levantar mais de 200 contos que realmente mereciam ser publicados! No processo de seleção, porém, procurei contemplar a diversidade do material levantado : é interessante ver que há no conjunto escritores canônicos como Machado de Assis, Monteiro Lobato ou Graciliano Ramos, e descobrir que também eles interrogaram a sexualidade. Mais interessante ficam ainda por figurarem ao lado de alguns dos nossos mais talentosos pornógrafos como Hilda Hilst, Dalton Trevisan ou Reinaldo Moraes, ou da extraordinária literatura erótica produzida por nomes ainda pouco conhecidos. Assim reunidos, os mais de 50 autores desta antologia vêm dar voz a um erotismo que é, antes de tudo, um excesso da imaginação.
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Eliane Robert Moraes
Conto Erótico Brasileiro
Tinta-da-china   22,90€

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