Noiserv: “Tudo o que faço são sempre espelhos da minha personalidade”

O nome Noiserv é, provavelmente, muito mais conhecido do que David Santos. O músico lançou em 2021 o seu livro três-vezes-dez-elevado-a-oito-metros-por-segundo.
Maria Joana Almeida Conversou com ele sobre música, sobre escrita e sobre as decisões da vida.
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P-o te vou perguntar porquê Noiserv, já o deves ter explicado várias vezes noutros espaços (eu depois procuro). Mas interessa-me que fales deste projeto. A música, foi-se desdobrando e acontecendo em paralelo na tua vida de estudante na faculdade. Neste caminho paralelo houve um momento onde decides seguir só a música. Quando foi o click?
R-Existiram vários momentos na verdade. A vida vai acontecendo, e dia-a-dia vamos tomando pequenas decisões que anos mais tarde parecem enormes. Talvez essas pequenas decisões tenham tomado um peso mais sério quando algures em 2007 pedi à minha “chefe” na Siemens, onde trabalhava, para ficar apenas em part-time porque precisava de tempo para gravar um disco, queria ter um disco nas lojas, pelo menos tentar. Na altura, ela disse-me que isso era contra as regras da empresa e que não seria possível, optei por me despedir. Voltei à faculdade, fiz o mestrado, segui na faculdade com uma bolsa de investigação. Algures em 2012, não renovei a bolsa e fiquei apenas com a música.

P-Tu sentes-te artista? Ou sentes-te artista numa definição muito própria tua? Como é que te defines?
R-Não te sei responder em concreto. Acho que sou uma pessoa que gosta de fazer coisas, e de lutar por elas. Gosto de estar sempre a pensar e inventar qualquer coisa. Gosto de me entusiasmar e concretizar. Gosto muito de música e de me emocionar com ela.

P- Disseste-me uma coisa muito interessante durante o tempo que conversamos, qualquer coisa como “uma pessoa que tira tempo da sua vida para me escrever merece que eu responda” Quando ouvi lembrei-me de pensar que tu tens os pés bem assentes na terra. É uma afirmação importante e revela muito sobre ti. A música mudou-te ou, pelo contrário, o que tu levaste para este projeto é o que faz dele o que é?
R-A única coisa, e que grande coisa, que a música me mudou foi um sentimento de concretização, até de algum orgulho maior em mim próprio e naquilo que as pessoas dizem gostar que faço. De resto, sou igual, nunca deixaremos de ser humanos, não voamos, não somos maiores que ninguém, podemos, ou não, ter a sorte de nos darmos mais às pessoas, mas só depende de nós.

P-Acabei de ler o teu primeiro livro, “três-vezes-dez-elevado-a-oito-metros-por-segundo”. Conta-me este processo de estrutura e conteúdo. Em que lugar e que ponto do tempo começou este livro?
R-Terá começado há uns 3/4 anos escrevendo a primeira frase do livro, “Três Luzes acenderam ao mesmo tempo em Três Janelas diferentes”. Estava sentado no alpendre de casa do meu pai, que entretanto já foi vendida, estava a responder ao desafio de uma amiga minha para escrever um pequeno conto, e assim começou. O processo de escrita foi longo e bastante espaçado, ia pegando no livro de tempos em tempos, até que de repente senti que a história estava fechada e pronta para o próximo passo, pensar no objecto físico que a iria acompanhar.

P-O livro é metódico, ao mesmo tempo que criativo e profundamente poético. Talvez pudéssemos pensar como se poderia incluir a palavra “metódico” entre palavras tão..”livres”. Sentes este livro como um espelho da tua personalidade? O que queres que as pessoas guardem da sua leitura?
R-Acredito que tudo o que faço são sempre espelhos da minha personalidade, é até um boa forma de me compreender. Não pensei muito no que queria que as pessoas guardassem, mas para mim esta história é sobre a importância de nos vermos, de olharmos com cuidado, de notarmos os detalhes das coisas, se de alguma forma as pessoas guardarem esse sentimento no fim da leitura, fico feliz.

P-As tuas palavras não se perdem em floreados e são diretas. E parece-me um exemplo bonito de que como podemos retirar poesia da Física de Einstein. Houve várias frases que reti, uma delas, “(…) quando algo a acontece ao mesmo tempo não é possível haver ordem, pois é o tempo que estupidamente nos ordena quando menos é preciso”. Como defines na tua vida, o “tempo certo”? O “tempo certo desta música” ; o “tempo certo deste livro”?
R-Numa história, numa música, há uma altura em que se sente que já está, que está no “tempo” certo, mas sinto eu, e não quer dizer que seja igual para todos. Na vida, é mais complicado e não tenho a mesma capacidade, vamos vivendo e percebendo que por vezes o tempo é tempo porque passou tempo.
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David Santos/Noiserv
três-vezes-dez-elevado-a-oito-metros-por-segundo
Edição de Autor  11, 99€

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