Daša Drndić: uma memória do holocausto
CRÓNICA
| agostinho sousa
A história de Haya Tedeschi, uma jovem judia a quem autoridades nazis roubam o seu bebé, fruto de uma relação com um militar SS, no período da ocupação da Croácia durante a 2.ª Guerra Mundial. Em torno deste trauma, que a perseguirá toda a vida e a levará a procurar o seu filho, desenrolam-se uma multiplicidade de personagens, situações ficcionais e acontecimentos reais, desde esse período de guerra, com destaque para o holocausto nazi, até ao fim do século XX, com uma densidade e uma síntese que retratam cruamente acontecimentos históricos conhecidos, retratados nesta passagem: «Há princípios absolutos e inquestionáveis que todo o homem SS deve manter, guincha Himmler diante dos seus companheiros em Poznan, em 1943. Um princípio básico deve constituir regra absoluta para os homens da SS: Devemos ser honestos, decentes, leais e companheiros para com os membros do nosso próprio sangue e para mais ninguém. Aquilo que acontece a um russo, a um checo, não nos deve interessar minimamente. Aquilo que outras nações possam oferecer como bom sangue do nosso tipo, nós aproveitaremos, se necessário, raptando os filhos deles e educando-os aqui connosco. Se outras nações vivem na prosperidade ou morrem de fome, só me interessa na medida em que precisamos deles como escravos para a nossa cultura; caso contrário, isso não interessa. Lembrem-se, nós seremos insensíveis e rudes apenas na medida em que isso for necessário. Nós, Alemãs, somos o único povo do mundo que tratamos os animais com decência, e trataremos esta espécie animal humana cortesmente e humanamente.»
Uma obra soberba pela forma como é tratado um enredo denso de inúmeras e tão características personagens, onde ficção e acontecimentos históricos se entrelaçam, numa escrita multi-temporal, empolgante, capaz de prender o leitor na ânsia do objetivo final de Haya Tedeschi.
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Daša Drndić
Trieste
Sextante Editora 18,80€
Espinho, 25/04/2021