Cláudia Lucas Chéu: Bons textos cheios de mulher e de coragem

CRÓNICA
| Rui Miguel Rocha

Textos escritos em pandemia para o Público. Bons textos, cheios de mulher e de coragem, quotidianos, como não podia deixar de ser, loucos uns, tristes outros, nunca permitindo a indiferença.
“A mulher sábia sabe o mesmo do que um homem sábio – bastante pouco.” A mulher sapiens, o ser necessário repetir tudo isto para os estúpidos. Treinar para ser melhor “são músculos que se treinam, tanto a dádiva como a imaginação.”
O quotidiano em que julgamos tudo normal e não é, nem nós nem ninguém “todos sabemos que ninguém é normal, que há vários níveis loucura, mas que ninguém escapa a um certo nível de insanidade.”
A inocência nem sempre praticada, mas vivida “na infância, tudo tinha o mesmo valor. Praticar linguados, jogar à bola ou dar biberão ao bebé careca.”
E ser mãe ou pai, progenitor “Desde que veio ao mundo, sou obrigada clampar as artérias ou esvaio-me em sangue de cada vez que a olho com atenção.”
Vejo Rubem Fonseca, vejo Kafka, são dias e dias de escrita e somos o que nos resta de nós. “Basta estar vivo para se estar sujeito a levar porrada.”
Alguns passaram ao lado, outros trouxeram lágrimas “difícil é ser perdoado”. Bons títulos como “É melhor acender velas do que amaldiçoar a escuridão.”
Há pouco tempo um texto escrito por uma mulher com este tão importante sentido: “as acções são sempre autênticas, não são como as palavras.” O amor, sempre o amor, o que não se serve porque amor limpo “podes aparecer quando te apetecer, mesmo no escuro, porque enquanto estivermos juntas nunca nos há-de faltar luz.” Escrevi amor limpo e logo a seguir, ou antes?: “E o nosso amor, talvez por antagonismo, pareceu sempre mais limpo do que o mundo.”
Outro grande título “Fumar no Duche”, a crónica fantástica “Gatinhos Fofos”.
Muitos alertas para o que temos cá dentro , a nossa própria casa, o nosso próprio eu “há anos que não me suporto.”
Mas também a alegria, como Vinícius “por isso, brindo a todos os escândalos da alegria e rio-me, rio-me sempre que posso, enquanto me for possível escolher ser alegre em vez de triste”. A favor do amor E contra as injustiças: “olhamos em frente e o horizonte parece mais baixo. É como se o Sol nascesse e se pusesse uns metros abaixo do normal, debaixo da linha do mar, submerso.” Isto para os negros, como para tantos outros.
E outro grande título: “Talvez Te Falhe a Ternura” antecipando que, mesmo eu não concordando, “A partir dos quarenta tens a certeza de que vais falhar.” Mas concordo quando se diz “não acredito em alma gémeas.” Não acredito mesmo, mas acredito que “ ninguém merece levar porrada, ninguém merece sofrer em silêncio.”
Ainda tempo para dois lindos textos, um sobre Salinger, outro sobre o bairro. E ainda outro rubenfonsequiano onde “Não Há Altruísmo Possível”
Mas o melhor está antes, quase nortenha, quando no fim da crónica: “Mas o que realmente distingue uma mulher de uma grande, grande senhora é a capacidade de olhar para estas regras, perpetuadas ao longo dos tempos, e riscar todo o manual escrevendo, clara e explicitamente, uma única palavra: Fodei-vos.
Adorei.
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Cláudia Lucas Chéu
A Mulher Sapiens
Companhia das Ilhas  16,50€

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