Anabela Mota Ribeiro | Por Saramago

1-Como surgiu a ideia deste seu livro «Por Saramago»?
R-Como jornalista, o género a que mais me dediquei foi a entrevista. Gosto de perguntar, gosto de escutar, gosto do efeito de detonação que surge das palavras do entrevistado, da potencialidade que há no diálogo. Isso permite-me pensar com outra pessoa, e depois seguir os meus próprios caminhos, autonomamente, ajuda-me a compreender e a criar perplexidades.  Não raro, entrevistei mais do que uma vez uma pessoa. Essa conversa continuada, em andamento, suscitada por um livro, pelo novo, e que normalmente acontece quando temos do outro lado um criador, permite um aprofundamento da relação. Então, não sei reconstituir o momento exacto em que pensei fazer “Por Saramago”, mas percebi que as várias viagens ao universo saramaguiano (as entrevistas a José e a Pilar, o texto sobre a casa de Lanzarote, a ida ao México ou ao Brasil “com” Saramago que me deixaram perceber uma devoção táctil pelo autor) constituíam um testemunho importante e eram uma forma de dizer o quanto o admiro. Depois, eu já tinha feito “Paula Rego por Paula Rego”, também com entrevistas, com um apuro estético incrível e a mão segura da editora Guilhermina Gomes da Temas e Debates; e achei que fazia sentido replicar, de um ponto de vista formal, esse objecto tão conseguido. Por isso, além dos textos, há em “Por Saramago” uma colecção de fotografias que iluminam o texto. São cerca de 65, todas originais, todas feitas de propósito para o livro, da autoria da Estelle Valente. Os dois livros têm capa dura, uma sobrecapa, um papel que apetece cheirar, uma impressão excelente. 
 
2-Ao escrever este livro, ainda se surpreendeu com alguma nova faceta de José Saramago?
R-Surpreendo-me sempre com os entrevistados, mesmo quando os entrevisto mais do que uma vez e mesmo quando parece que já disseram tudo. Há sempre uma cintilação nova. Cada encontro tem uma dinâmica própria que depende dos sujeitos, do momento em que estão, da sintonia, e também do que suscita a entrevista. Acho que me surpreendi, a primeira vez que o encontrei, por ser mais gentil do que sisudo, pela disponibilidade para pensar alto.
 
3-Neste livro foca a sua atenção em dois livros («As Pequenas Memórias» e «A Viagem do Elefante»): porquê?
R-Fernando Gómez Aguilera, biógrafo de Saramago, comissário da exposição A Consistência dos Sonhos, assina o posfácio do meu livro, a que chama O último fulgor de Saramago. De facto, são os últimos anos que estão representados no meu livro. As entrevistas a Saramago têm como pretexto os dois últimos livros (as “Pequenas Memórias” e “A Viagem do Elefante”), a entrevista a Pilar del Río aconteceu por altura de “Caim”. Mas estes livros são apenas o ponto de partida para o diálogo; entendo-os sempre como caminhos de onde partimos para chegar a outros lugares, esperados ou não, principais ou secundários. Por exemplo, a entrevista com Pilar ensinou-me muitas coisas sobre o que é crescer no franquismo (como aconteceu no caso dela), além de revelar aspectos importantes de Saramago e da relação que tinham. Esse é o lado bom de uma entrevista: sabemos como começamos, não sabemos onde vamos dar. 
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Anabela Mota Ribeiro
Por Saramago
Temas e Debates   19,90€