Alberto Miranda: “Isabel II já não é uma lenda viva, mas um mito”
1-Qual a ideia que esteve na origem desta biografia «Isabel II: Rainha e Mulher»?
R-O universo das famílias reais sempre me interessou e consegui aprofundar os meus conhecimentos sobre este tema graças ao meu trabalho de jornalista, e graças aos livros que estou sempre a comprar e às leituras que fui fazendo. Esta minha especialização num tema, quase marginal no panorama da comunicação social, levou-me a ser várias vezes convidado para ir às televisões falar de realeza quando havia casamentos, por exemplo. Por isso, quando decidi escrever sobre isto quis fazer um livro genérico e assim nasceu As Dez Monarquias da Europa, que foi lançado em maio deste ano. Depois de um livro abrangente, quis ir ao particular e focar-me numa personalidade ímpar das casas reais e essa pessoa, pela sua dimensão, só poderia ser Isabel II. Para responder à sua pergunta, o que esteve na génese deste livro foi dar a conhecer melhor quem era a soberana mais famosa do mundo, sobretudo na sua dimensão privada e mostrando esta dualidade na sua vida como rainha e como mulher. Fiz o livro a pensar no ano do seu Jubileu de Platina, só não contava que ele fosse publicado dias depois da sua morte.
2-Do seu ponto de vista, como se explica a importância de Isabel II e o seu profundo legado um pouco por todo o mundo?
R-Para ser conciso? Pelo seu carisma… mas a pergunta exige uma resposta ampla, que é complexa, pela sua dimensão simbólica. Isabel II, era até 8 de setembro, o dia da sua morte, uma lenda viva. Uma rainha e uma mulher à escala planetária. Viveu 96 anos e reinou durante sete décadas. É obvio que a idade lhe deu mais popularidade. Era um ícone pop, da indústria cultural, que se deixou retratar por pintores e fotógrafos contemporâneos e isso também ajudou a dar-lhe uma dimensão verdadeiramente internacional. Ela sabia que isso era uma forma de a eternizar. Sem ser uma celebridade, como ela própria fazia questão de o dizer, a rainha ganhou um carisma único, um afeto inimaginável, como foi visível durante as suas cerimónias fúnebres, e uma identificação, que atravessou gerações e fronteiras. O seu grande legado, que o filho terá de conquistar, é esta identificação, este afeto e este carisma, que para uma monarquia são o seu garante de sobrevivência e de adesão popular. No caso de Isabel II, tudo isto era voluntário, nada era forçado. O seu sentido de dever era genuíno, vincado no seu espírito, graças à educação que recebeu dos pais e dos avós, os reis George V e Mary. Os súbditos reconhecem-lhe o seu espírito de devoção e de sacrifício para com o Reino Unido, mas também em relação à Commonwealth. Falava-se muito, antes de ela morrer, na abdicação, mas essa palavra não existia no léxico de Isabel II. Ela própria jurou, quando atingiu a maioridade, que iria “dedicar toda a minha vida, seja ela curta ou longa, ao serviço da grande família imperial” e essa promessa cumpriu-a. A rainha morreu, como sempre quis, na cama, ou seja, no exercício das suas funções. O facto de continuar a trabalhar, mesmo numa idade avançada, e sempre lúcida, era outro fator de adesão. As pessoas sentiam carinho por ela quando a viam de bengala, mas de pé, a receber dignatários, como aconteceu dois dias antes de morrer. Quem não se espantava de a ver como era uma mulher de visão, ao conceder audiências, em plena pandemia, via Zoom? E depois, mesmo os seus hobbies era um elemento de admiração e de agrado. Quem não a gostava de ver a montar a cavalo, com mais de 90 anos? Quem não a gostava de ver rodeada dos seus cães? Ou de lenço na cabeça no campo? Embora se soubesse que tinha um grande sentido de humor, era capaz de surpreender como o fez no sktech ao lado do ursinho Paddington ou ao lado de Jams Bond? O espírito de união da família era outro traço da sua personalidade que encantava. Daí não gostar de escândalos e de querer mostrar que a família real, por ser a primeira, deveria ser exemplar. O facto de, antes de morrer, ter dito que era sua vontade que Camilla fosse rainha ao lado de Carlos, foi de uma grande visão, pois se não o tivesse feito, a sua morte iria trazer esse problema e esse debate iria ser, certamente, mais polémico. Ao tê-lo feito quis deixar um recado importante: a transição para o novo reinado deveria ser pacífica para o bem da própria monarquia. E essa foi sempre a sua prioridade.
3-De que forma esta sua obra inova e permite uma melhor compreensão da vida desta rainha planetária?
R-Quis traçar um perfil o mais próximo possível do que era a vida de Isabel II. Esta biografia resultou de várias leituras de livros e revistas. Como ela própria não dava entrevistas, as suas descrições psicológicas e comportamentais são feitas com base em relatos de próximos e de pessoas que com ela privaram. Como já disse, o livro fala da sua vida pública e privada, do seu lado institucional e do seu lado familiar. Estão aqui presentes duas dimensões: a rainha e a mulher, a conhecida e a desconhecida. O seu papel como soberana e chefe da Igreja Anglicana é conhecido, mas mesmo este tem aspetos curiosos que não são conhecidos do grande público. Depois, apesar de toda esta dimensão planetária, a mulher mais famosa do mundo, a sua vida íntima, os seus gostos e a sua essência continuavam a ser um grande mistério. Foi o mergulho nesse lado que tentei fazer. Quis contar aspetos inéditos, desconhecidos da grande maioria, para a dar a conhecer melhor. Além de uma narração que não obedece a datas, quis trazer à luz do dia outras histórias, como a sua passagem por Portugal; conto 96 curiosidades sobre ela (96 era a sua idade), mas também a descrevo de A a Z e faço uma cronologia, com as datas mais marcantes da sua existência. Por fim, faço várias árvores genealógicas para mostrar como é prima dos reis da Europa, como ela e o marido têm dois antepassados em comum e qual é a sua descendência. Espero que tenha conseguido abrir o apetite dos seus leitores para o meu livro. É que Isabel II já não é uma lenda viva, mas um mito, que merece ser melhor conhecido.
__________
Alberto Miranda
Isabel II: Rainha e Mulher
Guerra e Paz 17€