Luís F. Rodrigues | Manual de Crimes Urbanísticos


1- De que trata este seu livro «Manual de Crimes
Urbanísticos?
R- Apesar de ser uma área de vital importância para a
qualidade de vida das pessoas, o urbanismo tem sido sempre visto como um
assunto demasiado técnico para o cidadão comum – e como tal, negligenciado na
comunicação social, no discurso político e na praça pública. Em 2011, pretendi
contrariar essa tendência escrevendo um livro que, redigido numa linguagem
acessível e enriquecido com dezenas de ilustrações práticas, esclarecesse o
leitor acerca das causas que dão azo à violação das mais elementares regras de
planeamento urbano e geram a degradação e insustentabilidade da vida citadina.
Felizmente (ou infelizmente, depende do ponto de vista), esse livro esgotou.
Assim, em 2017, estamos a reeditar uma versão revista e ampliada do “Manual de
Crimes Urbanísticos”, esperando que esse convite à cidadania criado pela
primeira edição, possa agora expandir, enriquecer e renovar-se através da
leitura e divulgação desta segunda edição.
2- Na sua análise, as cidades ainda podem ter solução ou os
crimes serão cada vez mais irreversíveis?
R – Se acreditasse na ausência de soluções para os problemas
da cidade, não só não escreveria este livro, como nem sequer me dedicaria à
actividade profissional de urbanista. Contudo, tem razão quando refere que
alguns crimes são irreversíveis (destruição de património relevante para dar
lugar a intervenções meramente especulativas, por exemplo), no entanto, parte
da nossa missão enquanto técnicos, passa não só por impedir essas intervenções
mais danosas e evidentes, mas também, elucidar o cidadão para a gravidade de
outras situações que nem sequer fazem a manchete de jornais. O grau de
sofisticação de alguns crimes urbanísticos é de tal ordem, que, para além da
sua irreversibilidade, eles ocorrem de forma imperceptível e com total
impunidade. Infelizmente, a nível de criminalidade urbanística chegámos mesmo
ao ponto daquilo a que os psicólogos denominam de Síndrome de Estocolmo: por via
de um intenso marketing corporativo, os cidadãos são de tal forma influenciados
para criar empatias com intervenções urbanísticas medíocres e danosas, que eles
próprios passam a encará-las com entusiasmo e apreço. O «Manual de Crimes
Urbanísticos» pretende ser um contraponto crítico a esse cenário idílico que
alguns promotores urbanísticos menos sinceros pretendem criar.
3- E o que podemos fazer nós, cidadãos, para evitar este
problema?
R – Cultivar uma atitude crítica. E quando eu digo
“crítica”, não digo “pessimista”, “destrutiva” ou “agressiva”: a atitude
crítica rege-se por uma conduta que não se satisfaz com respostas
estereotipadas dadas a uma determinada questão; ela pretende ir mais longe,
investigando essa questão sob os mais diversos prismas e recorrendo às mais
diversas fontes. Em suma, a atitude crítica não aceita passivamente algo que
instintivamente nos parece errado – mesmo que sancionado por personalidades ou
instituições creditadas para o efeito. Felizmente, essa emergência cívica
crítica faz-se cada vez mais sentir em blogues e redes sociais portuguesas, por
exemplo. Em certas autarquias, as acções e as reivindicações submetidas aos
executivos municipais por plataformas e movimentos de cidadãos independentes,
chega mesmo a ser mais dinâmica e empenhada do que certas oposições
comprometidas, ineficazes e esclerosadas. Será que isto diz mais acerca da
vitalidade dos movimentos cívicos ou da degradação das instituições políticas
que deveriam zelar pelo interesse público? Em qualquer dos casos, um “Manual de
Crimes Urbanísticos” pode ser um bom ponto de partida para uma participação
cívica e política mais clarividente e efectiva.   
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Luís F. Rodrigues
Manual de Crimes Urbanísticos
Guerra & Paz   17€