Um livro que é um ensaio e um contributo para a memória de muitas pessoas: as canções de liberdade que tiveram um papel de instrumento político e de cidadania em tempo de oposição à ditadura. Além disso, permite uma visão muito alargada pois não se confina a Portugal.
Segundo os autores “uma canção pode não mudar o rumo da história, mas incomoda e faz pensar”. Nem mais.
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1-Qual a ideia que esteve na origem deste livro “Canções da Liberdade”?
R-Jorge Mangorrinha – Este era um livro que faltava, porque não existia, nesta temática, um que abrangesse todas as geografias do mundo. O binómio entre a música e a política tem sido estudado em diferentes abordagens e perspetivas direcionadas a contextos particulares, pelo que se crê ser este trabalho um contributo que sistematiza informação dispersa e desejavelmente importante para entender, num só documento, realidades que até se repetem nos ciclos da história. Este estudo traz para o presente a importância da canção como instrumento político e de cidadania contra a opressão e as injustiças que perduram no mundo. Embora estas canções não sejam, na sua essência e nos seus fins, assumidas por toda a gente, elas são instrumentos de transformação. Uma canção pode não mudar o rumo da história, mas incomoda e faz pensar. Porém, houve algumas que estiveram em viragens históricas.
2-A uma distância de mais de 50 anos, que síntese é possível fazer do papel das canções de intervenção na história de Portugal na fase final da ditadura?
R-Jorge Mangorrinha – Ser contra o regime era ser a favor de ideais de vida e um pretexto para a renovação da cultura portuguesa. O contexto artístico internacional favoreceu o florescimento em Portugal de uma canção que se traduzia em diferentes terminologias e multiplicidade de formas, mas sempre uma canção comprometida, mais ou menos dissimulada em estar contra o estado das coisas e um movimento musical urbano comum, com um público na sua maioria universitário e de classes de oposição aos regimes. Assim, a canção começava a descolar para subtis e metafóricas alusões à política, encoberta por trocadilhos com aspetos do quotidiano, conjugando a crítica social e a canção ligeira propriamente dita.
3-Na segunda parte do livro, apresentam uma lista de 50 músicas/discos mais relevantes: critérios da vossa escolha?
R-Abel Soares da Rosa – O Lado B convida o leitor ao debate, as músicas aqui apresentadas não são definitivas ou as melhores, ou as mais relevantes… é sempre uma escolha pessoal e emocional. 50 músicas, 50 discos em homenagem aos 50 anos do 25 de Abril de 1974, através de um olhar pela última década de ditadura portuguesa, mas convocando várias geografias. Estas escolhas espelham a diversidade de culturas e abrangem vários estilos musicais, com o cuidado de não repetir artistas. A cantiga, a música, continua a ser uma “arma”, e a cultura é a nossa melhor resistência nesse caminho pela liberdade, contra todas as formas de discriminação política, social, étnica, religiosa ou de género, e, ainda, com preocupações ambientais. É este o desígnio das escolhas apresentadas, de Amália a Adriano Correia de Oliveira, passando por David Bowie, Dylan, Sérgio Godinho, Brel, Chico Buarque, Carlos Paredes e tantos outros que formatam as Canções de Liberdade.
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Abel Soares da Rosa/Jorge Mangorrinha
Canções de Liberdade. A Política Cantada em Portugal e no Mundo (1964/1974)
Editorial Caminho 27,90€
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